Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


23-05-2001

História do Senhor Silva por Ily Silva Lucas


Memorias
“É impressionante a comunhão dos povos através das tradições que preservam”
(Margarida Silva e Castro)

“História do Senhor Silva”
por Ily Silva Lucas

Meu Pai, Francisco Antônio Alves da Silva , nasceu em 1883 , na cidade de Bragança , norte de Portugal. Veio para o Brasil junto com seu familiares para tentarem nova vida . Ele sempre me dizia quando eu era pequena: “Você tem sangue azul , sangue real .”E eu quando criança caia e me machucava e ia correndo gritando para meu pai: -“Pai o senhor sempre diz que temos o sangue azul ! Mas ele é vermelho !”. E assim justifica-se o parentesco de Francisco Alves da Silva com a família real , os nobres de Bragança.
Já minha mãe , Laura Augusta Alves da Silva , que por ironia do destino , era prima de primeiro grau de meu pai, também veio para o Brasil no início do século para tentar nova vida com seus pais . Laura vivia em Val Bom Pites , próximo a Mirandela , Tras os Montes .Francisco estabeleceu-se no Brasil no município de Ribeirão Preto e Laura em Uberaba . Anos mais tarde se encontraram e lembraram que quando minha mãe Laura era pequena , Francisco a viu e disse : “Ainda vou casar com esta menina !”. E assim se fez , mesmo com a diferença de 15 anos de idade entre os dois, se casaram em Uberaba .Tiveram doze filhos .
Francisco Antônio Alves da Silva ,agora conhecido por toda Uberaba, como SENHOR SILVA , era um simpático e cortês português , culto e um grande poeta . Tinha uma frota de caminhões que fornecia lenha para a Mogiana ( Estação Ferroviária) , também teve fazendas e estabelecimentos comercias , portanto assim com todo seu entusiasmo e simpatia contribuiu para o progresso da cidade de Uberaba e fez valiosas amizades , tornando-se um homem público de grande respeito na cidade. Com o tempo seus filhos foram crescendo ouvindo histórias de Portugal, tanto de meu pai quanto de minha mãe , dos natais com neve onde assavam castanhas na lareira e também contavam das maravilhas de Portugal , da terra que tanto tinha saudade. Meu pai sempre dizia chorando : “Tenho uma imensa vontade de ver de novo o pôr do sol da minha terra.” E assim os anos se passaram e ele e minha mãe Laura sempre que planejavam ir a Portugal , matar as saudades dos que lá ficaram, acontecia alguma coisa , como por exemplo falecia alguém . E assim temiam de medo, quando diziam que iriam voltar a Portugal ,de que alguém morresse.
Mas essa vontade permaneceu latente dentro de mim , Aily Alves da Silva , meu nome de solteira , que depois quando casei descobri que não era Aily e sim Ily , agora Ily Silva Lucas, com o sobrenome de meu marido Adelmo Lucas Ribeiro , também um grande homem inovador que contribuiu para a cidade de Uberaba trazendo o asfalto para as ruas e com isso um maior progresso da cidade.
Como ia dizendo sempre tive muita vontade de conhecer a terra de meus pais ,a terra de seus sonhos , e esse desejo foi realizado graças a minha neta ,Geisa Ribeiro Machado ,que sempre me pedia e ouvia atenciosamente para contar as histórias de meus pais e sobre a terra maravilhosa, Portugal. Após o falecimento de meu marido , eu já com 68 anos de idade tinha perdido aquele ânimo para viajar , mas minha neta Geisa me incentivou , no ano de 1998 , exatamente 100 anos após o nascimento de minha mãe Laura em 1898 , justificando-se assim que nunca é tarde para realizarmos um sonho .
Fomos a Portugal em agosto de 1998 procurar parentes , já que havíamos perdido o contato há muito tempo . Tínhamos apenas uma carta da Tia Helena datada de 1978 , mas mesmo assim Geisa persistiu na minha esperança de ainda encontrar algum parente . Alugou um carro na cidade do Porto e partimos para Tras os Montes . Chegando em Mirandela procuramos incessantemente pelas pequeninas aldeias de Val Bom Pites e Torre Dona Chama .
Perguntamos , andamos e pesquisamos por todos os arredores de Mirandela .Até que após chegarmos a em Val Bom Pites paramos para conversar com um senhor , já de idade, , que capinava um pequeno jardim e perguntamos a ele se conhecia a D Helena Machado (irmã de minha mãe ) ele disse: “A casa dela é aquela ali ! ” e apontou , mas disse também que ela havia falecido há 8 anos .
Meu coração se entristeceu , e disse a mim mesma : “Porque não vim antes , meu Deus ?”. E assim com uma dor no peito e as esperanças já um pouco diminuídas fomos até a casa indicada por aquele senhor e batemos na porta . A casa era bem rústica feita de grandes pedras sobrepostas e o chão era coberto de pedrinhas pequenas. Um senhor bem simpático abriu apenas meia porta e olhou bem desconfiado .
Logo perguntou se éramos da Igreja Universal ,dissemos que não e que éramos do Brasil. Assim mostramos a ele a carta e ele reconheceu que a letra da carta era sua , pois quando ela foi escrita em 1978 , Tia Helena já estava muito doente e pediu para que ele Hemenezindo do Nascimento Machado , meu primo de primeiro grau, a escrevesse , foi uma emoção indescritível.
Ele não sabia o que fazer, correu para dentro daquela simples casa e gritou : “Alzira , Alzira os familiares do BRASIL estão aqui !.”E assim também conheci minha prima , Alzira da Conceição Machado . Fiquei muito feliz de Ter realizado um sonho de meus pais e senti que eles ali estavam presentes naquele momento comigo, muito felizes também. Tomamos um café e comemos um queijo delicioso . Após muitas palavras trocadas de recordações e até de novas descobertas , parti em companhia de meus primos ,que me levaram para conhecer a casa onde minha mãe nasceu. A emoção foi muita , toda a descrição do lugar e da casa me fez lembrar todas as histórias que minha mãe contava. Levaram-me também para conhecer outro primo , Fernando Firmião Alves, filho de outro irmão de minha mãe (José Manuel Alves ) . Nos trataram muito bem e contaram inúmeras histórias . Como a de seu irmão Manuel Maria que ainda reside em São Paulo e que só conseguiu ir para o Brasil com ajuda de meu pai que lhe pagou a passagem e que sente falta de correspondências desse irmão .Também contou-me que naquela mesma época o meu pai havia sido chamado para ser cônsul de Portugal no Brasil , notícia que eu não sabia , pois era muito pequena naquela idade. Sempre me correspondo com Fernando e sua amável esposa Laura .
Voltei ao Brasil e tive que fazer uma angioplastia , acho que meu coração palpitou demais lá em Portugal , mas hoje estou muito bem graças a Deus. Agora , com a ajuda e incentivo da nossa grande pesquisadora e historiadora Maria Margarida Dias da Silva e Castro , que juntamente com o Elos Clube de Uberaba , presidido por ela , não vamos deixar a história , nossas raízes e nossa cultura se apagarem. Geisa , minha neta sempre dará continuidade a esse propósito e a nossa história utilizando dos inúmeros meios de comunicação , guardando fotos , escritos e várias histórias para contar a todas as gerações seguintes e assim está escrita um pouco de minha história .
Que se tornará eterna a parti de agora .