Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


20-03-2021

HISTÓRIAS DO SAL - Alhos Vedros Luís Santos


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QUANDO ÉRAMOS MESMO MIÚDOS, AO OLHARMOS PARA AS SALINAS, O QUE NOS FASCINAVA ERA O PROCESSO ALQUÍMICO DE SABERMOS QUE ALI, NAQUELAS QUADRÍCULAS ONDE SE RETINHA A ÁGUA TRAZIDA PELO VAI-VEM DO MAR, ELA HAVERIA DE SE TRANSFORMAR EM CUBOS CRISTALINOS, QUAL TRANSFORMAÇÃO DE METAIS VULGARES EM OURO. LEMBRAMO-NOS DE TRÊS GRANDES CONJUNTOS SALINEIROS EM ALHOS VEDROS: NO ATUAL PARQUE DAS SALINAS, NA FONTE (A CAMINHO DO CAIS NOVO) E NO ESPAÇO CONTÍGUO AO CAIS VELHO, AGORA BATIZADO POR CAIS DO DESCARREGADOR. MAS, CERTAMENTE, QUE DESDE O RIO DE COINA ATÉ ALCOCHETE, SUL DO TEJO, LABORARAM MUITAS MAIS AO LONGO DOS SÉCULOS, A DAR SAL AO MUNDO.

QUANDO ÉRAMOS MESMO MIÚDOS, ERA HABITUAL IRMOS ALMOÇAR COM O PESSOAL DO ARMAZÉM DO SAL, NO LARGO DA GRAÇA. O MEU PAI LEVAVA-ME. LEMBRO-ME BEM DOS SENHORES ÁLVARO E JÚLIO, FIEL DE ARMAZÉM E MOTORISTA, ENTRE MARNOTOS, GENTE DA MESMA FAMÍLIA. E LÁ ESTAVA, AO LADO DA MESA CORRIDA EM QUE SE COMIA, O ENORME MONTE DAQUELE OURO BRANCO QUE NOS MIRAVA, MAIS AS VÁRIAS BALANÇAS EM QUE SE PESAVA. ENIGMÁTICO, O MONTE DE SAL QUE SE ENCOSTAVA À PAREDE DO ARMAZÉM, LADO DIREITO.

OU, QUANDO O TI ALFREDO ESTACA, CANASTRA DE SAL À CABEÇA, ÁGUA SALGADA CORPO ABAIXO, CORRIA POR CIMA DAS PRANCHAS, NUMA HABILIDADE ARTÍSTICA DE EXTRAORDINÁRIO EQUILÍBRIO QUE MAIS PARECIA UM BAILADO DO QUE SUOR DO ROSTO.

ESTA NOSSA LIGAÇÃO AO SAL É DE SEMPRE. AINDA HOJE, VAMOS AMIÚDE AO BAIRRO JOÃO DA SILVA, NOME DO GRANDE INDUSTRIAL SALINEIRO QUE FEZ UMA FORTUNA IMENSÍSSIMA PELA REGIÃO, COM INÚMERAS CASAS E PROPRIEDADES ENTRE ALHOS VEDROS E SETÚBAL, PELO MENOS. SABEMOS DE DOIS DOS SEUS FILHOS. QUANDO O PAI MORREU, NOS BENS QUE DETINHAM EM ALHOS VEDROS, DIVIDIAM RENDAS, DE CASAS E QUINTAS, QUE AS PESSOAS DEPOSITAVAM NAS MÃOS DO MEU PAI EM INTERMEDIÁRIO FAVOR…

UM DIA, ANTÓNIO JOÃO DA SILVA, UM DOS IRMÃOS, PEDIU AO MEU PAI QUE FOSSE TER COM ELE AO ARMAZÉM DA SALINA, ALI AO CAIS DO DESCARREGADOR. ACOMPANHEI-O, COM A IDEIA DE PERGUNTAR AO ILUSTRE SENHOR SE QUERIA ALUGAR O ARMAZÉM. FIQUEI MUITO IMPRESSIONADO COM AQUELA PRESENÇA DE HOMEM VELHO, MANDONA E SEGURA VOZ, QUE ENTRE DIABETES E QUASE TOTALMENTE CEGO, ERA DONO DE MEIA ALHOS VEDROS. DISSE-NOS TER GRANDE AFEIÇÃO POR AQUELE SÍTIO, A PRIMEIRA DAS SALINAS QUE O PAI ADQUIRIU E A PARTIR DA QUAL INICIOU A IMENSA FORTUNA. O MEU PAI ACABOU POR LHE FICAR A PAGAR ALUGUER PELA QUINTA DO IMPÉRIO, UMA DAS QUINTAS ENTRE QUINTAS, ONDE DEPOIS SE HAVERIA DE PERMITIR A INSTALAÇÃO DO AERÓDROMO, TAL COMO A CONSTRUÇÃO DA FASE INICIAL DO ATUAL CANIL DOS CÃES ABANDONADOS. E FOI TAMBÉM ASSIM QUE, ENTRE SAL E QUINTO IMPÉRIO, FICÁMOS A PERCEBER UM POUCO MAIS DA NOSSA ALMA COMUM.

(NA FOTO, EX-ARMAZÉM DO SAL NO LARGO DA GRAÇA, EM ALHOS VEDROS)

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