Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


07-06-2017

A cada hora há cinco estrangeiros que se tornam portugueses


Aumentou significativamente o número de estrangeiros que passaram a ter nacionalidade portuguesa. Cidadãos brasileiros são os maiores beneficiários. Relatório do Observatório das Migrações faz o balanço da última década

Mafalda Ganhão

MAFALDA GANHÃO

Raquel Moleiro

RAQUEL MOLEIRO

O número de estrangeiros que passou a ter nacionalidade portuguesa aumentou consideravelmente desde as alterações legislativas introduzidas em 2006, o que se traduziu em cerca de 402 mil “novos” cidadãos portugueses no espaço de dez anos - entre 2007 e 2016. Contas feitas, dá uma média por hora a rondar os cinco pedidos aceites (mais precisamente 4,6). A conclusão resulta do levantamento estatístico reunido no “Acesso à Nacionalidade portuguesa: 10 anos da lei em números”, estudo do Observatório das Migrações apresentado esta terça-feira e coordenado por Cristina Reis Oliveira.

Nesse período, constatam os autores, “quase meio milhão de cidadãos pediu a nacionalidade portuguesa (477 mil pedidos em dez anos)”, o que significa que, “em média, 48 mil novos processos deram entrada por ano”, tendo a resposta sido positiva para cerca de 40 mil indivíduos/ano. Em concreto: 401.669 novos portugueses na década em apreço.

Comparativamente, nos dez anos antecedentes registaram-se cerca de sete vezes menos concessões, ou seja, “em média apenas cerca de 5,6 mil processos ao ano”, sublinha o estudo.

Apesar das mudanças já referidas no enquadramento legal, que deixou ‘cair’ a “situação de discriminação positiva para os falantes de português e/ou origem de ex-colónias portuguesas”, continuam a ser os estrangeiros oriundos de países onde se fala português que mais adquirem a nacionalidade em Portugal, refere o estudo. A evolução traçada fixa em 74% a taxa de concessões de nacionalidade a residentes estrangeiros com origem do Brasil e PALOP em 2008, percentagem que foi variando nos anos seguintes, mas que se manteve sempre acima de 55%, “estabilizando desde 2015 nos 64%”.

Considerando o ano de 2016, os cidadãos brasileiros foram os maiores beneficiários, seguidos dos cabo-verdianos e depois dos ucranianos.

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Alterações aconteceram também no que se refere aos canais de acesso à nacionalidade. Se para os imigrantes o casamento era a principal via, doze vezes mais que a naturalização, a partir de 2006 esta passou a liderar (42,1% do total das concessões em dez anos).

A análise dos dados permitiu concluir que, em simultâneo, a taxa de indeferimento dos pedidos recebidos “registou uma descida considerável”, indicador que contribui, segundo os autores, para que Portugal apareça mencionado em estudos internacionais como “um dos raros países europeus” em que a reforma legal “tornou os procedimentos e requerimentos para a aquisição de nacionalidade menos discricionários pelas autoridades”.

O caderno estatístico apresentado esta terça-feira realça três factores externos “fundamentais” para analisar a propensão para adquirir a nacionalidade portuguesa. São eles a relação histórica entre os países; os regimes de cidadania dos países de origem - partindo os pedidos sobretudo dos cidadãos a quem é permitida a dupla nacionalidade, não tendo estes de abdicar da sua nacionalidade de origem; finalmente, os anos de residência em Portugal.

O estudo conclui, por outro lado, que os efeitos da reforma legislativa não se fizeram notar apenas na imigração, mas também na emigração. É expressiva a tendência de crescimento quando considerada a atribuição da nacionalidade a filhos de portugueses nascidos no estrangeiro. Se em 2007 e 2008 esta “representava 57% do total de atribuições de nacionalidade originária”, em 2016 passou a representar 92% - resultados que também refletem o aumento da emigração portuguesa nos últimos anos, sublinham os investigadores

Segundo o texto de apresentação, este primeiro “Caderno Estatístico Temático”, que integra a “Coleção Imigração em Números” do Observatório das Migrações, visa compreender, em matéria da atribuição de nacionalidade, a “progressão muito rápida do país face aos restantes países europeus”, fazendo “um balanço - em números - dos impactos da primeira década” pós-reforma legislativa, nomeadamente identificando tendências.

PORTUGAL, #1 EM CIDADANIA

Thomas Huddleston, especialista em políticas europeias de migração e orador convidado no lançamento do caderno estatístico do OM, revelou esta terça-feira que Portugal é o primeiro país em matéria de acesso à nacionalidade entre as 48 nações analisadas no Migration Integration Policy Index (MIPEX). Partilha o top 5 – mas com liderança folgada – com a Suécia, Alemanha, Nova Zelândia, Bélgica e Austrália, ultrapassando outros países com reconhecido pendor para o acolhimento e integração como o Canadá ou a Holanda. Em último fica a Letónia.

Ainda de acordo com Huddleston, responsável no Migration Policy Group pelo MIPEX, para os imigrantes que vivem em Portugal a obtenção da nacionalidade permitiu-lhes alcançar um melhor emprego (42%), sentirem-se mais integrados na comunidade (32%) e prosseguirem com os estudos até a um nível superior (28%). “A nacionalidade é o maior investimento na promoção da integração. Permite uma residência fixa e direitos, principalmente aos refugiados; aumenta a integração laboral, em especial de grupos vulneráveis; dá uma maior proteção contra a discriminação; estimula a participação política, formal e informal, e a defesa contra a extrema-direita; e permite uma vida mais satisfatória para todos”, explicou o perito na Assembleia da República.                                                                Sem poupar elogios à política de imigração portuguesa – “Portugal tem um dos mais coerentes modelos de cidadania e integração do mundo desenvolvido, que o tornou líder entre os ‘novos destinos’ da imigração” - o especialista revelou, porém, que o processo de obtenção de nacionalidade revela mais obstáculos do que lei propriamente dita. A burocracia é um indicador onde Portugal se distancia da média europeia (a 15), mas aqui para pior. Huddleston lamenta ainda o encerramento, em 2008, do Gabinete de Apoio à Nacionalidade e as taxas oficiais “significativas” sem exceções previstas. E deixa a sugestão para uma futura entrega online dos pedidos de nacionalidade e para a realização de cerimónias públicas de obtenção da cidadania portuguesa – à americana -, com os media e as autoridades presentes. 07.06.2017 às 8h00

A cada hora há cinco estrangeiros que se tornam portugueses

 

   
 

A cada hora há cinco estrangeiros que se tornam portugueses

Aumentou significativamente o número de estrangeiros que passaram a ter nacionalidade portuguesa. Cidadãos brasi...