Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


18-04-2019

O meu pai não ia sacrificar o espírito crítico para poder voltar a Portugal. Nunca - Isabel Sena


Em Portugal para celebrar os 100 anos de nascimento do pai Jorge de Sena, Isabel fala da vida da família no exílio, da mãe Mécia e afasta a hipótese Panteão: "Os meus pais não podem ser separados".

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Isabel de Sena: “O meu pai não ia sacrificar o espírito crítico para pod...

Gonçalo Correia, Kimmy Simões

Em Portugal para celebrar os 100 anos de nascimento do pai Jorge de Sena, Isabel fala da vida da família no exíl...

 

 

  1. “Tudo o que resta do espólio teve de ir para minha casa”
  2. “No momento de embarcarmos disseram: esta senhora não pode embarcar”
  3. “O meu pai defendeu sempre a liberdade de as pessoas serem como querem”
  4. Sena “gostava de ter regressado”, mas “não ia sacrificar o espírito crítico para poder voltar”
  5. “Panteão? O meu pai e a minha mãe não podem ser separados”

É a mais velha dos nove filhos de Jorge e Mécia de Sena e foi a primeira (de três) a seguir a área das letras. Formada em literatura comparada, acabou a dar aulas de Espanhol. A culpa em parte é do pai, “um hispanista”, que lhe fomentou o gosto “pela literatura, sobretudo espanhola, embora ensine também literatura hispano-americana” nos Estados Unidos da América. Até hoje, contam-se pelos dedos de uma mão as entrevistas que deu em 69 anos de vida. Há um motivo simples para isso: “Foi a minha mãe que ao longo de três décadas se encarregou da obra do meu pai, não me cabia a mim dar entrevistas. Cabia-lhe a ela, era a mandatária e herdeira. E fazia isso melhor do que ninguém de qualquer maneira”.

Isabel de Sena está em Portugal para participar num programa organizado pela Fundação Calouste Gulbenkian para celebrar o centenário de nascimento de Jorge de Sena, autor de um dos melhores romances portugueses do século XX (Sinais de Fogo) e do grande conto-novela O Físico Prodigioso, dono de uma obra poética ímpar, que durante 58 anos de vida (morreu em 1978) foi primeiro cadete da escola Naval, excluído da marinha por lhe faltar aptidão para oficial, engenheiro civil depois e — por último e sobretudo — poeta, romancista, contista, ensaísta (destaque para os estudos sobre Pessoa e Camões), dramaturgo e professor universitário, entre outras coisas.

Esta terça-feira, dia 22, a filha mais velha de Jorge e Mécia estará na abertura e conclusão da “Jornada Jorge de Sena”, que juntará no auditório 3 da Fundação Calouste Gulbenkian amigos e especialistas na obra do pai, como o antigo presidente da República António Ramalho Eanes, Guilherme d’Oliveira Martins, Nuno Júdice, Gastão Cruz, Jorge Vaz de Carvalho, Jorge Fazenda Lourenço, Hélder Macedo e Jorge Silva Melo.

Ao Observador, Isabel de Sena deu uma longa e rara entrevista, em que recordou a infância em Portugal antes da família se exilar por motivos políticos, o embarque tumultuoso para o Brasil com a mãe e os seis irmãos (iam ter com o pai), a viagem não menos difícil que se seguiu com paragem no Dakar e a vida dos Sena nos Estados Unidos da América, que incluía receber “alunos em casa para discutir o Martin Luther King, o Nixon e as manifestações contra o Vietname”. Recordou mais coisas: a detenção do pai pela PIDE em Marvão (resolvida com um telefonema para Marcello Caetano), a vida de uma “família enorme” onde “nunca havia dinheiro que chegasse”, o espírito crítico que o pai “nunca iria sacrificar para poder voltar” a Portugal (embora”gostasse de ter regressado”) e um cultivo ímpar da “liberdade” e “autonomia” de que se reclama herdeira. E não há facetas do pai por descobrir? Claro que há: “O meu pai gostava muito de cinema e uma das coisas que nos divertia imenso a nós, aos filhos, era que quando havia cartoons, desenhos animados, ele ria-se como qualquer garoto”.


https://observador.pt/especiais/isabel-de-sena-o-meu-pai-nao-ia-sacrificar-o-espirito-critico-para-poder-voltar-a-portugal-nunca/