27-03-2019ARÁBIA FELIX - 2 HOLLYWOOD - B Henrique S FonsecaHenrique Salles da Fonseca
ARÁBIA FELIX – 2
Henrique Salles da Fonseca HOLLYWOOD B A questão que me coloco é a de saber se o Dubai é hoje uma réplica de Hollywood - não confundir com a inocente e lucrativa Bollywood de Bombaim - ou da Revolução Francesa.
E se quanto à obra edificada, temos que reconhecer que tudo foi feito rapidamente e com grande euforia, há agora que perguntar como vai ser o futuro quando é sabido que a última gota de petróleo foi chupada há 6 meses.
E se algo desagradar aos ocidentais - sobretudo aos presenciais ou às interpostas pessoas - que "seguram" tudo aquilo e lhes parecer que o sonho acabou e corre o risco de se transformar em pesadelo, não faltará ocasião para se perguntarem para que lhes servem as pernas e procurem novas paragens.
Como dizia o céguinho, "a ver vamos..." mas, entretanto, fico muito céptico porque não vejo os súbditos (numa monarquia não há cidadãos mas sim súbditos) dubaianos a evoluírem no sentido de conseguirem substituir os ocidentais na componente produtiva da vida; na do consumo, sim, até nos ultrapassam.
Mas como nós sabemos por experiência própria, numa economia pouco produtiva (caso do Dubai depois de chupada a última gota de petróleo), o Consumo não é motor do desenvolvimento mas sim da bancarrota. Portanto, deveria haver um muito amplo debate sobre o novo modelo de desenvolvimento daquele Emirato. Só que a expressão "muito amplo debate" é típica de democracia e isso é coisa inexistente no Dubai.
Então, como dizia Karl Popper, "resta-lhes irem para o Inferno". E o "Inferno" muçulmano será por certo algo que se assemelhe à Revolução Francesa.
Eis como se fecham as portas de Hollywood e se afia a guilhotina.
Mas, por enquanto, tudo exibe pujança e dá gosto ver. E eles até mostram as fotos do antes e nós gostamos de ver o depois.
Mas este simplificou as coisas e reduziu tudo a Mohammed bin Rashid Al Maktoum o que, na prática, significa que ele tem Mohammed como nome próprio e que é filho de um tal Rashid da família Maktoum. Os Maktoum são há algumas gerações os donos daqueles areais que este transformou numa Hollywood nº 2 mas sem «woods» (pelo menos, por enquanto). Na intimidade, chamam-lhe apenas Sheikh Mohammed. Nascido a 15 de julho de 1949, é desde 2006 também primeiro-ministro e vice-presidente dos Emirados Árabes Unidos. É dono de 99,67% da Dubai Holding.
Para saber mais, ver https://pt.wikipedia.org/wiki/Mohammed_bin_Rashid_Al_Maktoum
Então, foi a partir da década de 90 que o boom se deu e das dunas se fizeram arranha-céus, marinas, o aeroporto, a dessanilização da abundante água do mar, o ajardinamento (mais do que a arborização), as super-avenidas, o novo canal que atravessa a cidade, a "little Venice", a "Palmeira" que é um conjunto de linhas de areia devidamente consolidadas pela engenharia holandesa onde o luxo impera em casas boas, muito boas, óptimas e fantásticas, hotéis de muitas estrelas e etc.
Mas nem tudo é fútil. Assim, o Dubai passou a ser um centro de treino de camelos de corrida (as corridas propriamente ditas - e respectivo filet mignon que são as apostas - fazem-se no Abu Dhabi onde ficam as massarocas) e num centro de criação de ónixes (primos menores das palancas angolanas) contando-se por cerca de uma dúzia de animais - e disse! Mas se houvesse mais animais, seria perigoso fazer os rallies completamente desvairados em que nos levaram pelas dunas. Aí, sim, a adrenalina soltou-se em grande e numa das breves paragens que fizemos, uma velhota (um mês mais velha que eu) brasileira dizia-me: - Jovem (o jovem era eu) isto está a mortificar todas as frustrações da minha vida.
Depois de vermos o pôr-do-Sol do alto daquela duna muito conhecida naquele deserto, descemos por ela a baixo e entrámos num acampamento de beduínos para jantarmos e vermos um espectáculo de folclore. À falta de «mounting block», não consegui subir para o camelo que estava ali mesmo à minha espera. E a velhota a chamar-me «jovem»… O cameleiro disse-me para eu pôr um joelho no flanco do dromedário mas eu não sei o que é isso de montar à joelhada, não quis magoar o bicho com um joelho pelas costelas a dentro e desisti. Fica para quando eu for mais novo.
Por aqui se vê a «gentileza» com que os animais são «acarinhados» pelos joelhos dos turistas e, pior, com o beneplácito e até incitamento dos cameleiros. Ou seja, não é por eu não saber falar árabe que não debato a filosofia kantiana nem a política monetária emiratiana com os cameleiros.
Contudo, do Dubai, o que levo de mais negativo é o machismo misógino dos fulanos que impõem às mulheres o uso de vestes tão abomináveis como as burkas e outras que tais. E não me venham cá dizer que são uma minoria; digam, sim, que são poucas no meio duma multidão estrangeira que não é muçulmana. Quase que passam despercebidas mas falta o quase para que desapareça a misoginia.
O que levo de mais positivo é a coordenação entre a embraiagem, o acelerador e o travão que o nosso condutor fazia durante o rally desvairado por aquelas dunas além…
Finalmente, a questão da nacionalidade. Não perca o meu leitor o seu tempo a pedir a nacionalidade dubaiana pois esta só é concedida a quem seja filho de pai e de mãe dubaianos de gema; se for filho de um só da gema e o outro da clara, não terá sorte nenhuma, mesmo que nascido no Dubai. Ser dubaiano é mister de honra rara. Por mim, dispenso.
Regressámos ao barco a horas decentes depois do jantar e do espectáculo e zarpámos antes da meia noite.
Continua no próximo capítulo.
Março de 2019 Henrique Salles da Fonseca (nas dunas de corrida) Wednesday, March 27, 2019 ARÁBIA FELIX - 2
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