01-08-2005 Embaixada Galega da Cultura Renovação Núm Especial 2005
Dossier Especial números 21/22 “Qualquer pessoa que leia os textos dos autores das cantigas em versão original, e não censurados polos paranoicos dos Galaxia & Company”, pode observar o pouco que tem a ver a ortografia etimologica com a imposta pola Chunta” (Xunta) por decreto”
Conteúdo:
Umas palabras 1 (Mocho de Fidalgo)
Ordenando nos 2 meus livros
Galiza em Bruxelas 3 (Isaac A. Estravis)
Galeria pública por 5 Roi da Bolandeira.
O Vagabundo da 7 Catedral (Carmen G. Ares).
Originais da revista 9/ renovação nº1 de 17 interesse histórico
Umas palavras
Os textos que apresentamos vão dirigidos a todos aqueles individuos aos que o “culturalismo oficial" lhes fez crer que o galego literário nasce com a pub1icação da obra de Rosalia de Castro,sendo importante , obrigado lembrar que a própria escritora informa do desconhecimento das normas básicas da lingua que empregava. Naquela altura ainda na Galiza se não sabia da literatura medieval; e tal parece que hoje pretendem que assim siga acontecendo.
Qualquer pessoa que leia os textos dos autores das cantigas em versão original, e não censurados polos paranoicos dos “Galaxia & Company”, pode observar o pouco que tem a ver a ortografia etimologica com a imposta pola “Chunta” (Xunta) por decreto, seguindo os critérios castelhanistas do Instituto.
Também apresentamos o que foi publicado por nós nos últimos tempos, quanto a certas polémicas dirigidas tal semelha que a fazer crer que são as galinhas as culpáveis do apetite do zorro!! Só falta que al- gum “socialista” as acuse de “nacionalistas”... Quem fala de socialista fala de centralista!
Correm maus ventos. .Reproduzimos um comentário aparecido no semanário A Nosa Terra, obviamente na sua norma:
“Jornais e rádios de Madride cargam a tinta coma se fosse pólvora. El Pais informa da assembleia basca de municípios dizendo em titulares que assistirom 666 eis,o número cabalístico que representa a Satão. A verdade é que assistirom mais de 800, pero do que se tratava era de seguir conformando uma imagem distorsionada do nacionalismo. A este passo vão acabar reeditando a queima de bruxas e acusarao aos nacionalistas de fazer aquelarres.”
“Ficamos surpreendidos; ao régimem, ou melhor, à censura se lhe “colou” uma verdade concludente.”
As instituições seguem apoiando o castrapo ou gale- go de laboratorio. Página 2 Ordenando nos meus livros
Ordenando nos meus livros; os de texto por uma banda, os de criação literária para outra, em fim...Pôndo a livraria em ordem é que achei este o livro de Alfonso X O Sabio, do que tiramos copia de alguns dos seus escritos e ficamos surpreendidos que ao régimem, ou melhor, à censura se lhe “colara” uma verdade tão concludente. Impensable nos dias de hoje. Convem aclarar que naquela altura os estados da África de expressão lusa ainda não acadaram a independência.
“Pero que ei ora mengua de companha nem Pero Garcia, nem Pero d’Espanha. nem Pero Galego non iran conmegu. E bem vo-lo juro per Santa Maria Pero d’Espanha, nem Pero Garcia
nem Pero Galego non iran conmego. Nunca cinga espada con bona vainha se Pero d’Espanha, nem Pero Galinha nem Pero Galego for ora conmego.”
“Non quer eu doncela feia Que a minha porta peia. Non quer eu doncela feia E negra come carbón, Que anta minha porta peia nem faia como Sifon."
Também achei outro livro de Língua Espanhola:
LENGUA ESPAÑOLA
TERCER CURSO DEL GRADO DE APRENDIZAJE INDUSTRIAL SEXTA EDICIÓN
EDITORIAL EVEREST
15. FORMACION DE LAS LENGUAS ROMANCES.— E1 latín hablado en distintos puntos del Imperio presentaba notables diferencias. Entre otras, fueron causas determinantes de esta diferenciación idiomática el sustrato de las primitivas lenguas indígenas y la mayor o menor intensidad de la penetración lingüística o cultural en cada provincia. Con la decadencia del Imperio y, sobre todo, con Ia desmembraci6n que se produjo después de las invasiones bárbaras del siglo V, las provincias quedaron aisladas y acentuaron sus rasgos diferenciales. El latín hablado en ellas fue evolucionando con características especiales en los distintos territorios, hasta quebrantar la relativa uniformidad del tiempo del Imperio. Así nacieron, por lenta diferenciaci6n del latín, las lenguas que hoy llamamos romances o neolatinas.
16. EXTENSION E IMPORTANCIA DE LAS LENGUAS ROMANCES.— Con el tiempo, algunas lenguas romances han desaparecido, otras van alterado más o menos su extensión geográfica primitiva. Prescindiendo de las numerosas variedades dialectales existentes, las lenguas romances actuales son: (….) El castellano o español que al propagarse por América ha llegado a ser el más extenso de los idiomas románicos.
El catalán hablado en Cataluña, Valencia y Baleares, en la pequeña ciudad de Alguer (Cerdeña) y en el departamento francés de los Pirineos Orientales.
El gallego-portugués hablado en Galicia, Portugal y Brasil...
Galiza em Bruxelas
A VIAGEM
Uma vez mais tivem que colher o avião. Todas as vezes que o tenho feito foram sempre a gastos pagos: Madrid-SantiagoMadrid, Madrid-Rio de Janeiro, Rio de Janeiro-Campina Grande-Rio de Janeiro, Rio de Janeiro-Madrid, Madrid-Londres-Madrid, Santiago-Bruxelas- Santiago. E excepto a primeira relacionada com uma pessoa alaricana, todas as outras forarn como emissario da cultura galega.
A ultima vez tivem que fazer um grande esforço para convencer-me da necesidade de ir. Eram muitos os trabalhos de alunos que tinha por corrigir e as malditas avaliações estavam às portas. Comigo foram todos esses trabalhos e aproveitei o avião e os tempos livres para me recriar nas imaginações ilimitadas dos alunos e para jogar um pouco a continuar as historias por eles inventadas. E falava com as protagonistas dessas historias e com os proprios alunos amicavelmente.
De Santiago a Madrid fomos de brincadeira. 0 Paz não se sentia bem nas mudanças um tanto bruscas do avião, devidas talvez à orografia do terreno que sobrevoavamos. Ao falarmos das camareiras de Iberia eu dixem-lhes que as belgas eram mais simpaticas e assim aconteceu. A mim tocou-me ir ao lado de uma colombiana, pele tirando a cobriza, que era a primeira vez que vinha a Europa e que polo que me dixo não tinha muito claro o que ia fazer a Belgica. A chegada estava esperando-nos Manuel Cortês um jovem galego de perto da minha aldeia que actualmente está de funcionario em Bruxelas e que nos atendeu em todo momento mui bem.
A QUE IA?
De Ourense fomos: José Paz Rodrigues, Maria do Carmo Henriquez Salido e quern isto escreve. De Ponte-Vedra, Jose Luis Fontenla. E alá encontrémonos com Encarna Otero, de Santiago. A finais de Janeiro tinha lugar um encontro a alto nivel sobre a problematica das linguas minoritarias, no caso de galego “minorizada” no territorio galego de Espanha. Ape-
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“O galego-português é falado na Galiza, Portugal e Brasil...e também nas excolonias da África, Timor, Goa, etc...”
Capa do nº1 da revista cultural da Embaixada Galega da Cultura, renovação. O desenho foi obra do artista Galego Rolam.
“Um dos governos mais atacados foi o francês.”
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sar de ser uma viagem muito apresurada a eficacia e o trabalho da equipa foi intenso e excepcional. Foi raro o organismo que não visitamos.
O 29 foi o dia de intenso trabalho. Pola manha as actividades reduziram-se a explicarem os respectivos representantes as actividades levadas a cabo por cada uma das pessoas que usufruiram alguna bolsa, atrancos na missão encomendada por parte dos movernos en cujo territorio se levaram a cabo. Pola tarde submeteu-se a discussão um texto do deputado europeu Kuijpers, que foi revisado ponto por ponto. Pola parte espanhola louvou-se muito os trabalhos realizados por bascos e catalães, sobretodo por estes ultimos que contam com uma representação na capital do mercado europeu. Os bascos falaram de repressões no ensino, etc. Um dos movernos mais atacados foi o francês e donde mais representantes havia era de Italia, onde as línguas minorizadas aumentam como os cogumelos.
As linguas que contavam com tradução simultanea era o inglês, o francês, o alemão, o italiano e o español, que em realidade não era necesario já que ninguem falou nela. Os catalães, os bascos e Encarna Otero falaram em francês, o qual resultou chocante, pois ao terminar um dos traductores dixo “acaba de falar uma representante, que não sabemos a que pais representa”.
Como pola tarde podia intervir toda Pessoa que quigera, pola parte reintegracionista interviram José Luis Fontela e José Paz em galego. Eu manipulei os auriculares de cada tradutor e comprovei com agrado como a tradutora italiana o fazia mui bem, o mesmo o tradutor inglês, a francesa com alguna dificuldade e tropeço. O espanhol abstuvo-se na primeira intervenção rnas interviu na segunda quando estava ja a meiados do que estava a dizer Paz. Eu naquel mornento não me encontrava bern e alem disso o que tinha que dizer ja o tinham dito os outros, a não ser que tratasse questões pontuais e bastante pessoais, pois de resto ja estava dito todo. Maria do Carmo tarnpouco interviu. Ao falarern os galegos Kuijpers ficou urn pouco estranhado, pois era a prirneira vez que lhe soava nos seus ouvidos a doce fala galegoportuguesa e escusou-se de que não a sabia falar e de que não estava previsto tradutores para esse idiorna. Ao que Fontenla lhe respondeu que se o não sabia eram horas de que o soubesse, pois tratava-se da segunda lingua em importancia das romanicas, idiorna da CEE, da ONU, da UNESCO e de todos os organismos internacionais, e alern disso os tradutores tinharn funcionado muito bern. Pediu-nos que lhe apresentassernos por escrito as nossas solicitudes, o que assirn aconteceu. Ao final falamos com ele, sernpre muito amavel e com o senhor Jacobi corn quem ja estiveramos falando noutros mornentos e corn mais pessoas às que nos interessava. Entregamos publicações e pediu-se que instassern ao governo português para levar adiante o Acordo do Rio de Janeiro. E prometeram-nos que no futuro ja haveria tradutores dispostos. Despois estivemos no Centro Galego de Bruxelas corn o Presidente e alguns membros. Ali comemos esplendidarnente e pudemos comprovar o muito que se pode fazer quando as pessoas querern trabalhar. Ao dia seguinte falarnos os quatro na livraria “Orpheu” a um grupo de portugueses e galegos e decatamo-nos de que aquilo era uma projeção da nossa cultura e um remanso de paz dentro da capital de Europa. O resto do tempo dedicamo-lo a conhecer a cidade em companhia de Manuel Cortês ou pola nossa conta. Resultava supreendente deambular por aquelas ruas corn sabor historico e admirar aqueles monurnentos realmente excepcionais. Tambem pudemos comprovar corno a “progreso” ou, melhor dito, a especulação fai estragos nalguns lugares. Bruxelas é uma cidade pequena e muito espalbada. Uma cidade —talvez a única de Belgica— onde se da urn bilinguismo corn os nomes das ruas em flarnengo e frances, pois em todo a pais estão bern delimitados os campos onde se fala uma ou outra lingua.
Quigera que fichase constancia da diferente atitude do meu grupo a respeito dos outros, pois em todo momento falamos a nossa lingua e fomos perfeitamente entendidos, fora de casos onde havia que utilizar o francês quando queriamos comprar alguma cousa. Mesmo assim era bastante frecuente que nos respondessem no que nos falavamos, pois em Bélgica é rara a Pessoa que não falava varias linguas.
Tambem Quero que fique constancia da diferente atitude de Ramón Lorenzo –o bufão do ILG– que no tres de fevereiro dizia que o galego só servia para andar por casa. E está de professor de galego na Universidade!! Desde logo a atitude deste grupo o que tenta é a morte
do galego, pois do contrario seriam mais consecuentes e em lugar de encunicar-se iriam com a cabeça bem levantada. E resulta triste, verdadeiramente triste, que nas chamadas “Jornadas de la Lengua gallega” não soubessem transmitir a mensagem da realidade existente na Galiza e que quando os catalães se dirigiram a eles em catalão ou bem evitassem a desposta (porque a não a tinham) ou lhe respondessem em castellano. Se alguem os entende que venha S. Pedro e mo explique. Hoje, ja com perspectiva, olho com simpatia para todos aqueles que nos atenderam e assumiram a nossa realidade. É muito o que está por fazer e na Galiza ainda seguem actuando pola calada “mengues” dos chamados RR. Católicos.
Ourense, 28 de fevereiro de 1988 Isaac Alonso Estravis
Galeria Pública
O andaluz e o castelhano tenhem menos em comum do que a francês e o chinês. Os reintegracionistas louquearam... Torredo Suspensier in “Galeria publica” no dia dos Santos Inocentes
Seica os castelhanistas estão dispostos a “fabricar” uma sub—norma para os galego— falantes da franja baixo administravo asturiana!. Haveria que Ihes perguntar se a propria norma aficial não é tambem uma sub—norma do castelhano?
Ataulfo Sineiro Medeirinho In
“Renovacão”.
A Galiza é o unico pais do mundo onde para alguns Ilustrados” o ignorar o idiorna propno e escrevé—lo incorretamente não é sinonimo de ignorancia... E preciso ser mais parvo?
Moncho de Fidalgo in “Galeria
Publica”
Fazemos um apelo aos dirigentes da TVG para que troquem o nome oficial para galego: “TV—Galega” não estaria tão mal!. E quando vão deixar de "corne—lo caido” ,‘ATAr” o “AIRE” e confundir a cor "Preto" (em castelhano Prieto) por "Perto"?
Um espectador recabreado!
Lamento que numa porcentagem elevada as publicações portuguesas só façam resenhas de autores galegos que empregam o “castrapo” (galego-português castellanizado) e ignorem quase por completo que na Galiza há autores que utilizam corretamente o nosso idioma mum: o Galego-Português.
J.R in “Tertulia informal” Página 5
Recolhemos parte do discurso do novo presidente dos EEUU da “Europa Hipotetica” a seus concidadaos onde sauda a aparição da nossa revista:
RENOVAÇÃO eis algo para já imprescindivel agora que até há ousadia de proclamar, como se foramos parvos ou subnormais, que sornos Europa!. RENOVAÇÃO eis urn termo que exprime os nossos anseios de ruturismo e de futurismo e até de todos os ismos havidos e por haver...
RENOVAÇÃO é assim uma publicação feita em Madrid, centro não da pele de touro —porque não de urna vaca? fugindo de machismos desnecessario~— que alguns charnaram Iberia e outros Hispania e nós chamaremos tambem de alguma maneira algum dia, se calhar, mas que podemos chamar já Peninsula Iberica.
RENOVAÇÃO revista feita para galegos da Galiza Ocidental do Ocidente. onde se põe
o sol, a terra acaba e a mar começa. onde a rosto corn que fita a Europa é Galiza e Partugal. onde surge a mar tenebroso e esta a Finisterra. RENOVAÇÃO dizem que é urn projecto aberto.. RENOVAÇÃO não podia menos de nascer de mão galaica, da terra matriz da lingua, da terra mãe e berço da lingua. porque nao é por acaso que à “Patria da Lingua” e à “Lingua da Patria” se lhe quis cortar a sua natural expressão e expressividade mais de uma vez... Só quer rcnovar tudo, por tudo de patas ao ar, para recomeçar de novo, iniciar de novo uma caminhada juntos, de mãos dadas...
Retalhos obscenos
Retalhos narrativos ousados e difusos. Amado L. Caeiro (Pseudónimo de António Gil Hernández)
Visão espanhola da Galiza
Soava ritmico o tique—taque do relogio. Persisitia a duvida impassivel, quase eterna, margarida intermitente: “sim”, “não”,‘sim”, “não”.... Tudo parece amor de incerteza: “ama?”, ‘não ama?”, ‘ama—me?”, não me ama”?. Por firn, hesitantes, optaram par gelar a tempo até conseguir alguma decisão. Estavam a redigir, no congresso dos deputados sita na capital de Espanha, o estatuto de autonomia de Galiza.
“dialogo di amore”
— Toda a manhã trabalhei o teu amor. Carlos Alberto disse e acenou ironico para o amigo presente por acaso. Ela duvidava da verdade e do sentido. Ele, Carlos Alberta, não percebeu que as duvidas dela acabariarn em dalarasa realidade. Meu arnor não se trabalha. Apenas sou mulher e tu homem; o amor só... O Amigo presente tambem duvidou e essa efusão de hesitações rapinou o fio verbal dela. Fai nesse momento quando ele, Carlos Alberto implorou:
— Não queria ofender; quereria só conseguir que o teu amor fosse para mim labor gozosa. Ela sentia-se quase esvaziada. Ele, Carlos Alberto, sofreu uma triste olhadela do amigo. Já quase ausente. Polo ar houve fume e murmurios indecisos: — Não pudeste trabalhar; simplesmente o teu é servir como escrava. Para trabalhar o meu arnor requere-se vontade. Tu careces dela. Ele cantinuava a sofrer nem sabia se da plenitude do amor ou do esvaziamento da duvida. Nada pudo, quase, dizer; unicamente: — Margarida... E entre luzes nevoentas sentiu esvaecer-se o nome, petala a petala, como o seu, com o seu. O amigo ausentara-se de todo. O vento murmurava fora. Na lareira crepitava o lurne, esmorecente, vago, indeciso, escravo e doente, transrnudando-se em fume, já esvaziado, já sem petalas: sem mistura de ironia, manifestação pura da verdade e do sentido. Página 6
O Vagabundo da Catedral
Por Carmen González Ares
Hoje, amanheceu gris. Choraram as pedras. Derrubou-se a chuva por riba das janelas fechadas. Os vidros petaram no vento tremante coma as folhas no rio. Não acarinhava a luz nas farolas, detidas nas paredes amofadas, aterecidas no acougo das ruas. Das tuas ruas cativas, povo de pedra e agua. Que choras no berço da primavera. Chorar e ver que as bagoas seculares na fronte das casas imoveis. Rejamente, casas que olham de cara a um verao que não chega. As nuvens passeninhas admiram a teu latejar. O teu bulir do sangue que ferve nas entrafias da tua longa história, mitica e ferrosa.
Um homem atravessa polas beiras das ruas molhadas. Um homem só. Assobia baixinho por entre as paredes desfeitas do seu pensamento. Mira sem olhar ninguem. Vai, vai indo devagar. Os braços colgamlhe ao longo do corpo encolhido. Roupa preta e suja veste a sua miseria, arrastrada dia tras dia, na esmoleira do seu caminhar sem companha nem agarimo. Os olhos verdes ensanguentados. Não do sol da tardinha. Não do calor do lume na lareira, não do sorriso doce e aberto da agua que rebole na fonte do Toural. Não. E a vermelha do alcool. Venmelha de noites infinitas sem sonhos. A vermelha da soedade mais ingrata. Acolhida polas paredes arrecendentes a pedra e flores de erva e vento. As paredes que o observam passar.
O homem vai, vai indo cara à praça da Quintana, janela enorme onde o ceu se fai mar, campo de luz, terra de sementes na cidade fechada polos montes e o bruar das casas, juntas. Apertadas. Namoradas.
Baixa as escadas percurando não se derrubar. Doendo-lhe os pés envermelhados da friagem dos invernos sem fim, no povo que o ignora ao passar.
A catedral eleva-se na sua grandeza até as nuvens e esmaga a pequenez do homem encolhido. ‘Com estas mãos” —murmura— “eu pussem pedra sobre pedra para que ti, edificio dos meus sonhos, permaneças para sempre. Mentres eu, pobre de mim, tenho que baixar os olhos diante da tua imagem terrivel que não podo aguentar”.
A chuva peta-lhe nos ossos sem forças nem alento. Um berro fura o ar com o seu trono enraivejado. “Pero eu amo-te!” As palavras chegam até o cume do edificio como um estalo no amanhecer de sombras. “E odio-te por me matar”— rosna apenas sem voz.
O homem vai, vai indo sem folgos. Como todas as manhãs. Cravado no chão, aguarda, a punho fechado, os beiços encrespados e a alma rota de tanto chorar sem bagoas.
Debaixo das pedras escuita-se um gemer de vozes, a falar todas a um jeito. O homem, de joelhos coloca a orelha para ver se entende. O seu nome emerge do mais alá, berrando, gritando profundamente. Uma mão de ossos aparece pola greta de duas pedras. O homem estende a sua, banhada na chuva grisalha do amanhecer. A catedral cala.
O homem vai tocar a mfia de ossos. A catedral cala. O velho olha tras dele as inumeraveis pedras ergueitas com suor, o sangue e o trabalho. O ceu cuspe-lhe silêncios de dor nos beiços sem arume nem cor. A mão de ossos segue no ar. Os gritos assobiam no vento da janela. A catedral cala.
O homem pom-se de pé. Da-lhe as costas à mão que desaparece baixo as pedras. Apagam-se as vozes. O homem vai indo, vai indo. Cara a catedral. Ao seguinte amanhecer, ele voltará à Quintana. Outravolta, a mão sairá, escuitará o seu nome no ouvear dos companheiros que não virom rematada a obra do ideal. Pero não irá, não alongará o corpo cara a mão nem fará caso das vozes sepulcrais. Ainda não é tempo de abandonar. A catedral cala.
Hoje amanheceu cinzento. E tu, povo de pedra, cuspes fontes de soedade por riba do vagabundo, que há muitos séculos atravessa as estreitas veias do teu corpo até a catedral. Que ele ergueu com as suas mãos de suor, sangue e trabalho. E agora passeia a sua alma rota polos altos muros dum sonho que se nega a rematar.
Mentres, a catedral cala.
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O Mariscal (1)
José Ramom Rodrigues Fernández (Moncho de Hidalgo)
“Os meninos do lugar brincando num frio mes de Dezembro alongarom-se da aldeia e adentrarom-se numa cova do monte, reclamados por um delicioso aroma e uns celestiais sons nunca ouvidos. Esta cova esta situada num monte proximo A vila historica de Mondarei, antiga capital desta negião nortenha da Suevnia... Os meninos contarom logo na aldeia o sucedido mas ninguem acreditou na sua palavra inocente.
— Fantasias! —disseram os maiores. Mas eu tivem a paciencia de Ihes escuitar sua histonia... Desde então venho todos os Dezembros à cova secreta do Mariscal... Só eu conheço a sua localização. Os miudas que me contaram a historia perecerom os pobres num acidente de autocarro, quando se dirigiam à escola.
Lembro que os meninos ficaram impressionados pola barba ruiva do Mariscal que os convidou a merendar na sua subterranea morada, contavam—no com grande alvoroço. As suas roupas antigas, a sua espada e uma voz grave e energica pero carinhosa e calida cativou— os.
Como não ia eu acreditar na historia dos miudos! Falou—lhes do 1483, da sua resistencia ao “Reis—Bis”... da ponte do passamento e da sua fortaleza, A Frouseira! Quem saiba um minimo de historia proibida campreenderá aginha que uns meninos não se inventariam uma fantasia dum tema destas caracteristicas:
Credo, credo Viva o Mariscal —exclamavam os miudos imitando uma estranha voz.
Queriam vingar o sangue do Mariscal. Eu venho todos os Dezembros à cova, nunca vi nenhum Mariscal, mas sempre percebo um aroma estranho e inquietante. Não posso descrever com meu limitado vocabulario de mortal. Precisaria uma linguagem, como a que seguramente fala o Mariscal, para exprimir as sensações que sinto nesses instantes felizes quc permaneço na cova.
Eu sei que um dia o espirito rebelde do Mariscal ernergerá nesta nossa Suevnia, como o espirito dos grandes homens um dia virão para saudar-nos e anunciar a existencia dos perdedores da historia ao mundo inteiro...”
(1) Dedico o trecho de um romance em preparação à memoria de D. Ricardo Coelho Iglesias, um português que conhecia a Galiza como ninguem, magoa que assim não aconteça com outros vultos da cultura do pais irmão. Página 8
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CONSELHO: Moncho de Fidalgo, Tomé Martins, Suzana Couceiro, R. Queixomariu Fidalgo, Roi da Bolandeira, J.L. Galego, J. Luís A. Fernando do Savinhão. Ricardo A. Windsor. Nem Renovação nem as pessoas que compõem a Embaixada Galega da Cultura se responsabilizam das opiniões individuais assinadas ou de grupos identificados cujas idéias possam ser referenciadas ou comentadas. Páginas que pode visitar relacionadas com as nossas publicações: http://www.ldc.com.br/iclas http://www.uaisites.adm.br/iclas/galiza.htm
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