Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


22-03-2022

Com as mãos no ouro mas uma vida à beira da pobreza


Nos garimpos do Creporizão, no estado brasileiro do Pará, há quem tenha começado a trabalhar ainda adolescente e já esteja quase a chegar aos 50 anos. É um desses homens, que prefere não ser identificado, que afirma que “procurar ouro é como jogar num casino”. No entanto o cenário não podia estar mais distante daquile que identificamos com os "templos" das slot machines. Este tipo de garimpos, ou minas informais, são operadas por pequenas equipas de homens, que trabalham nos solos lamacentos e avermelhados com instrumentos rudimentares, semelhantes aos usados há séculos nesta actividade. São, na maioria dos casos, operações perigosas. E ilegais.

Depois de o governo de Michel Temer ter anunciado a extinção de uma área de reserva ambiental na Amazónia brasileira para abrir caminho à exploração das grandes empresas internacionais de extracção de minérios – e depois ter recuado parcialmente na decisão após forte oposição pública –  as atenções voltaram a estar viradas para este tipo de exploração.

O Creporizão encontra-se distante da Reserva Nacional de Cobre (Renca), que esteve no centro desta polémica, no entanto revela um retrato daquilo que se passa no país em termos de mineração clandestina ou informal. O ministro das Minas e Energia brasileiro, Fernando Coelho Filho, chegou a sustentar a sua decisão de extinguir a Renca afirmando que a exploração mineral legalizada seria um avanço em relação aos cerca de mil homens que estão a explorar aquela reserva de forma ilegal.

Existem 2113 garimpos com licenciamento no Brasil, de acordo com dados do Ministério, mas alguns especialistas ambientais garantem que existem outras minas de menor dimensão que conseguem escapar a estas regulamentações. Num país com a dimensão do Brasil, a área total usada pelos garimpeiros pode parecer pequena. No entanto os químicos usados pelos mesmos para separar o ouro das areias, como o mercúrio, são responsáveis por uma pegada de contaminação extensa, que põe em risco o ecossistema e ameaça as tribos indígenas. Em Março do ano passado, um estudo financiado pelo governo junto de aldeias indígenas no Norte do estado de Roraima, detectou níveis alarmantes de mercúrio.

As condições de trabalho dos garimpeiros no Creporizão apresentam também riscos. Casas improvisadas feitas de plástico e madeira dão abrigo aos trabalhadores, que num mês conseguem enviar cerca de 60 quilos de ouro. Mas, enquanto no mercado global essa quantidade pode chegar a valer milhões de euros, as sucessivas camadas de intermediários acabam por deixar os garimpeiros com uma porção minúscula dessa transacção. Em redor das minas, um bar, uma mercearia, uma igreja evangélica e prostitutas competem pela sua atenção (e rendimentos), quando os trabalhadores se encontram de folga.

O ministro Fernando Coelho Filho afirmou que uma nova agência de supervisão, cuja concretização necessita de aprovação no Congresso, permitiria uma maior coordenação das autoridades e mais inspecções para restringir a exploração ilegal. No entanto, um funcionário do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) acusa o governo de deixar alguns garimpeiros, como aqueles que trabalham no Creporizão, numa situação precária. “Não se pode simplesmente tirá-los dos garimpos e das cidades que vivem do ouro”, afirmou o oficial que não teve autorização do IBAMA para falar com a agência Reuters e por isso permaneceu por identificar. “O Governo não lhes proporciona condições decentes e por isso eles ficam abandonados por lá sem as condições mínimas de sobrevivência.”

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