Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


23-02-2017

A atitude de utopia do Zeca Afonso é o que nos move permanentemente


Associação José Afonso assinala os 30 anos da morte do cantor celebrando-lhe a vida, a obra e o exemplo cívico com concertos, tertúlias, exposições e reedições.

NUNO PACHECO 

19 de Janeiro de 2017, 9:15

Francisco Fanhais, Paulo Esperança e Rui Pato: importa é o reconhecimento da obra de José Afonso

A ideia é simples e directa: Insisto não ser tristeza. Foi José Afonso que o escreveu, num poema, e serve hoje de mote à celebração da sua vida, obra e exemplo cívico, a pretexto dos 30 anos passados sobre a sua morte (a 23 de Fevereiro de 1987). A lista das iniciativas previstas é extensa e foi divulgada à imprensa nas instalações em Lisboa da Associação José Afonso (AJA), que também completa 30 anos em 2017. Francisco Fanhais, cantor e presidente da direcção da AJA, justificou assim a escolha do mote: “Pareceu-nos sintomático por ele ser quem era: um homem de não desistir, de transmitir essa capacidade de luta aos outros. Não estamos conformados com o que a situação em que estamos a viver, por mais aberturas que possa haver (e há). Não se pode dizer que já atingimos um patamar paradisíaco e que a partir daqui está tudo a correr bem. Não. Por isso, a atitude de utopia do Zeca Afonso é o que nos move permanentemente.”

A seu lado, Rui Pato, médico de profissão, que acompanhou José Afonso à viola entre 1961 e 1969 (hoje é vice-presidente da mesa da assembleia-geral da AJA), completou a ideia desta forma: “Em 23 de Fevereiro de 1987 o Zeca pegou na trouxa e zarpou e, contrariamente ao que escreveu na Balada de Outono [a versão instrumental, publicada em 1964, tem arranjos de Rui Pato], os rios que vão dar ao mar não deixaram os seus olhos secar e as águas das fontes não se calaram, nem as ribeiras choraram, porque o Zeca continuou a cantar. E é isso que a Associação quer fazer.” Mas afastando o lado fúnebre: “Não queremos que estes 30 anos sejam virados para o umbigo da associação nem para o obituário. Mas sim para celebrar a vida, a obra e o exemplo do Zeca.”

José Afonso - Balada  de Outono no Coliseu» https://www.youtube.com/watch?v=ojj5FY3sVy4

Um “pai” da world music

Fundada em Novembro de 1987, com 14 núcleos em Portugal e 1 (aberto já este ano) em Bruxelas, a AJA foi declarada pessoa colectiva de utilidade pública em 2010 e o projecto comemorativo Insisto não ser tristeza foi declarado de “interesse cultural” a 15 de Novembro de 2016 pelo Ministério da Cultura. Paulo Esperança, vice-presidente da AJA, diz que isso é importante (sobretudo para efeitos fiscais e de mecenato, numa casa de “contabilidade organizada”), mas acha mais importante o reconhecimento da obra de José Afonso. “Uma das coisas com que a AJA se debate é algumas tentativas, muitas vezes malévolas, de encostar o Zeca a cantor de intervenção. Isso é reduzi-lo. É esquecer as influências que ele tem, na sua música, fruto das suas andanças por África, Trás-os-Montes, Beiras, Algarve, ilhas, Galiza e Astúrias. Tudo isso constrói o cadinho que dá origem à sua obra. José Afonso pode ser considerado o ‘pai’ da world music em Portugal.” Nas celebrações haverá concertos, mas Paulo Esperança diz que a AJA não quer apenas isso. “Queremos entrar na obra poética do Zeca, que durante anos foi menorizada, e queremos entrar na sua criação musical. Isso é muito importante para se perceber a dinâmica que levou a que determinada música nascesse assim.”

“A atitude de utopia do Zeca Afonso é o que nos move permanentemente”

 

 

   
 

“A atitude de utopia do Zeca Afonso é o que nos move permanentemente”

By Nuno Pacheco

Associação José Afonso assinala os 30 anos da morte do cantor celebrando-lhe a vida, a obra e o exemplo cívico c...