Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


18-12-2016

A dona do bordel dos ministros que deixou a fortuna à Misericórdia


A incrível história da madame Calado, proprietária da casa de prostituição mais exclusiva de Lisboa.  E o testamento escrito por José Hermano Saraiva       

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Esta senhora, Maria da Piedade Calado, caiu na prostituição por força das circunstâncias. Mas se não soube viver, soube morrer", diz Joaquim Nunes das Neves, antigo funcionário da Santa Casa da Misericórdia do Fundão, que guardou uma cópia do testamento da madame Calado, a dona da casa de passe mais exclusiva de Lisboa nos anos 50 e princípio de 60, frequentada por ministros e directores-gerais. 

Nascida em 1894 na freguesia de Boidobra, a 12 km do Fundão, fez fortuna como meretriz em Lisboa, até a prostituição ser ilegalizada por Salazar em 1963. A partir do dinheiro que acumulava com os negócios do sexo na sua "Pensão" Calado, num primeiro andar da Calçada do Carmo, 25, frente à estação do Rossio, acumulou capital suficiente, por exemplo, para emprestar 550 contos a um comerciante em 1943 (o equivalente a 272 mil euros a preços de hoje). Ele passou-lhe um cheque sem cobertura e ela pôs-lhe um processo, consultado pela SÁBADO na Torre do Tombo.

Analfabeta, mas rica
Mais impressionante ainda, em 1948 era proprietária da Quinta das Águas Livres, que vendeu por 1.800 contos (757 mil euros a preços actuais) a Manuel Santos Sobrinho. O caso deu origem a um novo processo, desta vez porque ela recusou pagar a comissão de 54 contos ao mediador que tratou da venda. Este pôs-lhe um processo a exigir a comissão, onde referia que Maria da Piedade Calado não sabia ler nem escrever, só assinar o nome. Apesar de analfabeta, tinha ainda um prédio na Calçada do Poço dos Mouros, na Penha de França, que arrendava a inquilinos – encarregava um procurador de cobrar as rendas por ela. E vivia num apartamento na Rua Castilho.

          

                                                                                                                                                                                                                                                                                          No Fundão, era proprietária da Casa do Bico, um palacete com um torreão, um elevador interior para a alimentação, um jardim de inverno no quarto e uma casa de banho toda em louça preta. "Tinha um gosto extraordinário e era de um arrojo tremendo, naquela época", recorda Carlos Couto, que viria a alugar o edifício para gerir a Estalagem da Neve. "Tinha um chauffer, que a conduzia num carro preto muito grande, enquanto ela acenava às pessoas. Na altura havia dez ou 15 carros no Fundão, mas o dela era o mais espampanante".       

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