Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


22-02-2016

O umbigo do mundo de Umberto Eco era em Portugal


O escritor tinha um fascínio pelo Convento de Cristo, em Tomar. Em 1984 visitou o monumento, de sobretudo e chapéu à Sherlock. Há quem diga que se sentou no Café Paraíso a escrever.

O autor italiano faz referência aos monumentos portugueses no livro "O Pêndulo de Foucault"

JUAN M. ESPINOSA/EPA

“Parti de Portugal e de Tomar com a mente em chamas”, dizia Umberto Eco através de uma das personagens do livro O Pêndulo de Foucault, publicado em 1988. O Convento de Cristo era o motivo da visita do escritor a Tomar em 1984, um ano depois de ser considerado património mundial da UNESCO, juntamente com o Castelo dos Templários.

Pelos vistos, a visita de investigação surtiu efeito. “Se eu conseguia imaginar um castelo templário, assim era Tomar”, acabaria por escrever. O passeio inspirou várias páginas e descrições de um dos seus romances mais conhecidos e punha Tomar no mapa com o carimbo de “umbigo do mundo”, recordou no Facebook Andreia Galvão, diretora do Convento de Cristo.

L'écrivain italien Umberto Eco, professeur à la faculté de philosophie et d'Arts de Bologne, pose le 30 septembre 1983 à Rome. (FILM) AFP PHOTO / AFP / - (Photo credit should read -/AFP/Getty Images)

Umberto Eco em 1983, um ano antes de ter estado em Tomar

Eco esteve várias vezes em Portugal e gostava particularmente da Cidade de Tomar, que visitava sempre que podia, chegando mesmo a apelidá-la de ‘Umbigo do Mundo’ (l’ombelico del mondo), expressão italiana para lugares cuja beleza e central importância se equiparam à da outrora capital do Império Romano”, escreveu a diretora. “Referiu ainda, através de um das seus personagens desse romance, que se comoveu ao entrar na Charola, o templo octogonal que reproduz o do Santo Sepulcro, núcleo de todo o monumento e onde tudo começou”, continua no mesmo post, partilhado por mais de uma centena de pessoas.

No entanto, “e com imensa pena”, confessa-nos por telefone, não chegou a conhecer o escritor, até porque só está à frente do Convento há dois anos. Foi Luís Graça, antigo diretor, quem guiou Eco por este lugar onde “os sobreviventes da Ordem [dos Templários] gozavam de plena liberdade e de garantias intocadas”, escreveu no livro.

Um livro muito barato

A visita a Tomar não foi a primeira de Eco a Portugal. Antes disso, já tinha estado em Lisboa pouco depois do lançamento de O Nome da Rosa, em 1983. Recorda Piedade Ferreira, na altura diretora editorial da Difel:

Lembro-me que fez uma sessão de autógrafos na Bertrand do Chiado que teve imensa gente e depois houve um jantar na Tágide por causa daquela vista magnífica em que se convidaram várias pessoas como o Assis Pacheco ou o Eduardo Prado Coelho”

A editora tinha surgido há pouco tempo, em 1982, “e depois de uma década de livros políticos, havia um interesse dos leitores por ficção”, conta. Piedade descobriu o livro quando ainda não estava traduzido em lado nenhum, um tesouro. “Foi muito barato, comprei-o muito cedo. Não foi daqueles leilões caros, foi uma coisa tranquila, o sucesso veio depois.” De tal forma que no ano seguinte, em 1984, quando Eco voltou para visitar Tomar para se inspirar para o próximo livro, também publicado pela Difel, O Nome daRosa já ia na sexta edição. “A tradução foi feita por uma senhora que não conheço com um curso de italiano, Maria Celeste Pinto, que tinha vivido em Itália. Agora a Gradiva reeditou-o com uma nova tradução.”

O nome da rosa. Difel

A capa d’”O Nome da Rosa” na edição da Difel

Do escritor que chegou a reencontrar na Feira do Livro do Frankfurt (durante a qual inclusive “se casou com uma alemã”) guarda boas recordações: “Era uma pessoa muito afável e acessível, era fácil ter um relacionamento com ele.”

http://observador.pt/2016/02/22/umbigo-do-mundo-umberto-eco-era-portugal/