01-09-2004Meu peito é de aço Eu sou dos Açores Xico XadrezTexto de Francisco José dos Santos Neto (Xico Xadrez)*
O singelo, singular, arquipélago os Açores, nove ilhas localizadas no Atlântico norte, já era colónia portuguesa no final do século XV. Foi aqui que a médica Maria Eduarda Fagundes Nunes nasceu e veio aportar em Uberaba. Devido à sua posição geográfica, ela informa com saudades,ponto de passagem e paragem para aguada das naus e embarcações que circulavam, indo e vindo... Indo e vindo, choque de civilizações, contruções inusitadas, fazendo comércio entre a Europa, África,Oriente e América. Foi em Ponta Delgada, bela cidade das caldeiras, que conheci Dr. Estrela. José Estrela Rêgo, que não é uma estrela só, são várias. Sua morte em primeiro de julho, cá do Atlântico, e no mundo todo, trouxe pêsames. Lembro que a engenheira Maria Margarida de Castro, pioneira do Elos Clube de Uberaba, moveu mundos e fundo para que percorresse o Atlântico e conhecesse Dr. Estrela e seu querido torrão. "Essa rota comercial explorada pelos portugueses e espanhóis atraía a cobiça e os olhares atentos daqueles países acostumados às lides marítimas que não aceitavam as determinações da bula papal de Julio II, Clausum( 1505), que confirmava a divisão dos mares e das terras entre as duas potências comerciais do século XV e XVI, Portugal e Espanha". Brigam Portugal e Espanha por direitos de terra e mar.E, para mim, os Açores já não são mais rota, são o meu próprio coração, que pulsa com seus ilhas,torna-me consciente do pulsar de minhas mãos. A história narra a guerra do corso onde piratas e corsários. Os ingleses,ah!os ingleses,franceses e holandeses, aterrorizaando mares e terras dessas desprotegidas e isoladas ilhas,saqueando e matando. O salto na história é longo. Hoje, Portugal e Açores são União Européia. Quanto progresso.São alziras,manuelas, joaquins, césares, analuisas, antónios e outros tantos que permitiram que a felicidade penetrasse todo meu ser e nunca mais me abandonasse. Depois do curso Açores: A Descoberta das Raízes, fui colocar em prática o que era solicitado. Como esquecer do choro do jovem que perdeu a chance de ganhar-me em concorrida simultânea de xadrez em Ponta Delgada. Vi, também na outra ponta, jovens que foram expulsos da América e não sabiam falar o português.Fui parar em um Encontro de Mulheres, em que as mães choravam tanto. Algumas de felicidade, outras de tristeza inaudita. Assim, é o Açores. Tanto leque, um caleidoscópio. Onde as palavras fluem e o canto se faz presente. Lembro Fernando Nunes, da Federação de Xadrez dos Açores, quanta dedicação. Vi esperança no olhar. O Troféu que conquistei ao vencer o I Torneio Luso-Brasileiro dos Açores merece lugar de honra, em Belo Horizonte, a capital das Minas Gerais, Brasil. E, os poemas, ainda há os poemas e o tanto de suas fantasias. Du Açores, fiz, ainda no Brasil, antes de embarcar fins de junho de 2001, no afamado e tão acalentado curso. Falo dos poemas porque às vezes me ajudam a dizer o que não me atrevo a falar. "Além do corso, me diz a querida e vitoriosa médica Eduarda, a inquisição lançava seus tentáculos sobre os ilhéus de origem judia afugentando-os para lugares distantes, como o Brasil, em busca de segurança e paz" . São marinheiros, aventureiros e padres jesuítas com freqüência se lançando em viagens clandestinas ou não, atraídos para o Novo Mundo sonhando com a fama e a fortuna ou para levar a religião cristã ao não civilizado". Quem sabe a Inquisição ainda está à solta tentando nos carregar para seus devaneios macabros. Mas quando a fome atingiu o arquipélago, trazida pelos desastres naturais, como os vulcões, muitos foram os açorianos que responderam ao chamado da metrópole portuguesa para colonizar e defender as fronteiras das terras brasileiras. Homens e mulheres na idade produtiva, em diversas épocas(sécs.XVII,XVIII e XIX), saíram em levas das ilhas para um mundo tropical, inóspito, desconhecido,à cata de uma vida melhor. Muitos se perderam como escravos brancos, outros não suportaram as rudezas ambientais e climáticas, mas os que sobreviveram implantaram na nova terra suas crenças, costumes e tradições que ajudaram com outros povos a formar a cultura popular brasileira, exulta a faialense Maria Eduarda, me lembrando as lições alvissareiras que o curso Açores: A Descoberta das Raízes trouxe em momento dos mais oportunos. Ao voltar, participamos com a angolana-brasileira-lusitana Maria Margarida de Castro, de diversas e das mais variadas, atividades do Elos Clube de Uberaba, inclusive, com a promoção de noites açorianas, fazendo ilações entre culturas,inspirando sentimentos, promovendo saraus literários,apoiando as artes plásticas. Assim, fazer este curso no amado Açores traz de volta para meu pensamento, minha alma, muito de minha própria história. Podemos afirmar com convicção que Santa Catarina e Rio Grande do Sul, por exemplo, são dois gigantes que nasceram dos Açores. POETANDO Lá, a inspiração não pára, como pude perceber ao fazer o poema Ilha do Pico, que compartilho com meus queridos, pois poetar sem compartilhar não é uma ação solitária, acho até que limita por demais os versos aos enfados. Falo, com carinho, de duas irmãs, com seu belo artesanato, fazem parte do cenário, assim como a mais alta montanha de toda Portugal. "Elas gostam de poesia Que beleza Alzira e Maria Fazem da Escola de Artesanato Du Açores uma simpatia, Me fazem ver a vida De uma forma diferente Mais colorida Chega de vida em preto-e-branco Em cores Quero viver/ do luar até o amanhecer Açores/ Mistérios Teares/ Decolores Ilha do Pico/Açores Num recanto montanhoso sei que vou apaixonar-me" A vida não pode ser em preto-e-branco. Nos Açores,as cores são reluzentes. Dizem que no Brasil vai ser feita a novela Açores. Terão que ser mais de mil capítulos. Quem fará o papel de Alzira, esta batalhadora da cultura açoriana. Dr. Estrela, quem se habilita? Lima Duarte? E o presidente César. Ana Luísa caberia bem em Vera Fisher. Para Alzira, o ideal seria Julia Roberts. São tantas histórias, tanta luta. E,muita, muita poesia. Cavalos-marinhos, brumas,caldeiras. Vapores, mágicas, energias sutis. Emaranhadas. O Santo Cristo dos Milagres vai me levar de volta eu sei. "Há um medo de sismos Quando chega a noite Há um silêncio estranho Longe, tão longe Meu pensamento vôa E, agradeço a Deus 500 Anos Afetos aos Açores" Lembro das missas e da beleza que são as Festas do Divino Espírito Santo. Sei que aqui no Brasil, em muito lugares, do Oiapoque ao Chuí, acima e abaixo, estas festas nos foram legadas pelos imigrantes açorianos. Como meu coração se tornou açoriano? Isto eu não sei. Mas, sei que Santo Cristo vai me levar de volta. Para encontrar um grande amor? quem sabe. Fazer uma outra poesia? quem sabe. Descobrir novos cenários? quem sabe. Quem sabe ouvir o poeta António Avallacorba, chegar correndo do Canadá e declamar novos poemas. Mas, este é meu e gostaria que ele ouvisse, para que soubesse que alguma coisa aprendi... "A Ilha do Pico completa 500 Anos Se você quisesse Poderia contar Meu vulcão Tanta garra Muito mistério Tanta luta Muros foram erguidos Vinhais seduzidos Fruto do trabalho Do homem do Pico". Hoje, fico aqui no meu trabalho. Curioso trabalho o meu. Passo de tabuleiros de xadrez para letras na Internet, a comunicação me inspira, é fonte de renovação, atualiza meus versos: "Quermesses, festas, debates Baleeiros, fugas, improvisos Ilhéus, reinóis, procissões
Toda monta inda é pouca Para celebrar esta canção De tão longo recolhimento
Houve solidão, eu sei Houve morte, também sei Mas, houve muita beleza que continua solta no ar". Aprendi muito em Fátima, São Jorge, Lisboa, Faial,Ilha Terceira, Tentúgal, Portela. Mas, uma longa viagem, que se faz ainda tão presente, começou na Ilha do Pico. Todos que fizeram o curso ainda estão presentes. Foi sensacional esta idéia do governo açoriano de reunir esta elite da açorianiedade. Fico pensando que o mais que posso ofertar são xeques-mate e esta prosa. Estava lá quando a vida no Pico completava 500 Anos. E, eu estava em Madalena. "A vida no Pico completa 500 Anos Já contei o que sei Mas, inda há muito mais Quem sabe, vou conseguir aprender o que falta saber deste mar, desta montanha do saber deste povo de um aroma sinuoso que significa muito E, não me deixa ficar calado".
Creio que foi uma canadense - portuguesa que reside em Toronto - que pediu-me para que quando fosse contar a história deste encontro não me esquecesse dela. Sim,jamais esqueci de sua face. E do seu olhar sereno pedindo que contasse tudo. A sua verdade é a minha verdade, minha amiga. O seu olhar me acompanha pelos meu dias". Eu sou paciente/ Com quem sabe amar/ Meu peito é de aço/ Eu sou dos Açores. E, me desculpem. Mas, eu não posso ficar calado.
*Francisco José dos Santos Neto (Xico Xadrez), o autor, é presidente do Elos Clube e participou do Encontro Açores: a Descoberta das Raízes, em 2001, na Ilha do Pico |