Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


15-06-2015

Xigubo José Craveirinha Edições 70


Xigubo
Autores moçambicanos
Autor José Craveirinha
Edição 2 ª
Editora Edições 70, 1980
   
Num. págs.

64 páginas

José Craveirinha, 1922-2003,moçambicano, foi um auto-didacta que desempenhou ao longo da sua vida diversas atividades tais como funcionário da Imprensa Nacional de Lourenço Marques, jornalista, futebolista, tendo também colaborado em diversas publicações periódicas, nomeadamente O Brado Africano, Itinerário, Notícias, Mensagem, Notícias do Bloqueio e Caliban. É uma figura incontornável e de referência da escrita em língua portuguesa e da literatura africana.

Da sua obra destacam-se Xigubo (1964), Cântico a um Dio de Catrane (1966), Karingana Ua Karingana (1974), Cela 1 (1980), Maria (1988), e Haminas (1997).

 

 Xigubo 

Minha mãe África meu irmão Zambeze Culucumba! Culucumba! Xigubo estremece terra do mato e negros fundem-se ao sopro da xipalapala e negrinhos de peitos nus na sua cadência levantam os braços para o lume da irmã lua e dançam as danças do tempo da guerra das velhas tribos da margem do rio. Ao tantã do tambor o leopardo traiçoeiro fugiu. E na noite de assombrações brilham alucinados de vermelho os olhos dos homens e brilha ainda mais o fio azul do aço das catanas. Dum-dum! Tantã! E negro Maiela músculos tensos na azagaia rubra salta o fogo da fogueira amarela e dança as danças do tempo da guerra das velhas tribos da margem do rio. E a noite desflorada abre o sexo ao orgasmo do tambor e a planície arde todas as luas cheias no feitiço viril da insuperstição das catanas. Tantã! E os negros dançam ao ritmo da Lua Nova rangem os dentes na volúpia do xigubo e provam o aço ardente das catanas ferozes na carne sangrenta da micaia grande. E as vozes rasgam o silêncio da terra enquanto os pés batem enquanto os tambores batem e enquanto a planície vibra os ecos milenários aqui outra vez os homens desta terra dançam as danças do tempo da guerra das velhas tribos juntas na margem do rio. 

José Craveirinha

 

Quero ser Tambor

 Tambor está velho de gritar

Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
corpo e alma só tambor
só tambor gritando na noite quente dos trópicos.


Nem flor nascida no mato do desespero
Nem rio correndo para o mar do desespero
Nem zagaia temperada no lume vivo do desespero
Nem mesmo poesia forjada na dor rubra do desespero.


Nem nada!


Só tambor velho de gritar na lua cheia da minha terra
Só tambor de pele curtida ao sol da minha terra
Só tambor cavado nos troncos duros da minha terra.


Eu
Só tambor rebentando o silêncio amargo da Mafalala
Só tambor velho de sentar no batuque da minha terra
Só tambor perdido na escuridão da noite perdida.


Oh velho Deus dos homens
eu quero ser tambor
e nem rio
e nem flor
e nem zagaia por enquanto
e nem mesmo poesia.
Só tambor ecoando como a canção da força e da vida
Só tambor noite e dia
dia e noite só tambor
até à consumação da grande festa do batuque!
Oh velho Deus dos homens
deixa-me ser tambor
só tambor!


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