Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


22-08-2014

Nuno Crato no Brasil aposta em sucesso de abertura de uma escola portuguesa em São Paulo



Alfredo Prado 22/08/2014 01:00 A abertura de uma escola portuguesa no Brasil, cuja necessidade seria discutível ou mesmo polêmica há duas ou três décadas, hoje parece ser consensual. O ministro da Educação de Portugal, Nuno Crato, quer "apressar" o processo. E, em entrevista ao Portugal Digital e África 21 Digital, fala também do Ciência sem Fronteiras e do reconhecimento de títulos acadêmicos "muito lento".   João Neto / MEC O ministro Nuno Crato reuniu-se em Brasília com o homólogo brasileiro, José Henrique Paim. Brasília - Mais vale tarde do que nunca. A abertura de uma escola portuguesa no Brasil, cuja necessidade seria discutível ou mesmo polêmica há duas ou três décadas, hoje parece ser consensual. Aos velhos imigrantes portugueses, sucede-se, sobretudo a partir dos anos oitenta do século passado, uma nova onda de imigrantes. Uns, com diferentes aspirações e exigências, são, muitos deles, executivos de empresas; outros, muitos, são jovens saídos das universidades que vieram procurar no Brasil o emprego e a remuneração que lhes falta em Portugal. A assinatura de um memorando de entendimento político entre os governos dos dois países, para abertura de escolas portuguesas no Brasil, trouxe esta semana ao país o ministro da Educação português, Nuno Crato, acompanhado do secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, João Casanova de Almeida. Escolas portuguesas no Brasil, Ciência sem Fronteiras, pesquisa científica e reconhecimento de títulos acadêmicos foram alguns dos temas abordados pelo ministro durante as conversações que manteve, primeiro, em Brasília, com os ministros da Educação e da Ciência e Tecnologia do governo Dilma Rousseff, respectivamente, José Henrique Paim e Clelio Campolina Diniz, e que terá, nesta sexta-feira (22), em São Paulo, com o secretário estadual da Educação, Herman Voorwald, neste caso com um foco preciso: a abertura de uma escola portuguesa na cidade, com currículo, gestão e tutela portuguesas e aberta a todas as nacionalidades. A instalação da escola na maior cidade brasileira - processo que Nuno Crato diz ser necessário "apressar", manifestando não compreender como só agora o projeto avança – poderá ocorrer, se tudo se desenvolver como desejado pelo ministro, em meados do próximo ano. Uma escola que, à semelhança de modelos já experimentados por outros países, entre eles a França, por exemplo, será, não apenas um centro de ensino, onde serão ministradas as disciplinas do curriculum do ensino português, com 12 anos de escolaridade, mas também um centro difusor de cultura e também de formação de professores. Hoje, Portugal mantém escolas da rede pública no exterior, sob tutela do Ministério da Educação, em Díli, capital de Timor Leste, Maputo, capital de Moçambique, em Luanda, Angola, e em Macau, na China, estando em projeto a abertura de uma escola em Cabo Verde. No Brasil, a cidade de São Paulo foi a escolhida. "São Paulo é a maior concentração da comunidade portuguesa, maior cidade do Brasil, o que não quer dizer que não possam ser consideradas outras cidades", disse Nuno Crato em entrevista aoPortugal Digital/África 21 Digital. Um projeto já esboçado, mas cujos detalhes só deverão ser definidos numa segunda etapa. Em princípio, será desenvolvido por fases. Algumas linhas orientadoras já estão, no entanto, traçadas. Assim, os 12 anos de escolaridade obrigatória em Portugal serão abertos de forma gradual; o corpo de professores será composto por docentes portugueses, já com experiência pedagógica em Portugal, e brasileiros; e, condição essencial, com reconhecimento académico nos dois países. "Estamos a trabalhar para que o curso seja reconhecido em ambos os países, abrindo o acesso às universidades de um e outro país", explanou o ministro. Numa cidade em que o custo de vida é alto e a disparidade salarial e as assimetrias sociais grandes, uma das questões que se colocarão aos gestores será o custo que cada família ou aluno terá de dispender para frequentar a escola. As contas ainda não estão feitas, mas, garante Nuno Crato, "as mensalidades serão substancialmente inferiores às praticadas por instituições de ensino internacionais idênticas". Por outro lado, para situações econômicas mais frágeis, haverá possibilidade de recorrer a um sistema de bolsas ou de intervenção da "ação social escolar". Os custos do projeto por enquanto não estão estimados ou não são dados a conhecer. "O investimento português terá de ser cauteloso, faseado, e com envolvimento da comunidade local", afirma o ministro da Educação.  Por isso, a conversa agendada para esta sexta-feira com o secretário estadual de Educação do governo de São Paulo é particularmente importante. A possibilidade de cedência de um edifício é um dos pontos que poderão ser abordados. Ciência sem Fronteiras: Portugal destino "tabu" Quando o governo brasileiro lançou, em julho de 2011, o programa Ciência sem Fronteiras a pasta da Educação era comandada pelo ministro Aloizio Mercadante, um experiente político ligado ao Partido dos Trabalhadores (PT), hoje chefe da Casa Civil do Palácio do Planalto, próximo de executivos e figuras proeminentes da comunidade lusa de São Paulo. O ambicioso programa tem por objetivo levar milhares de estudantes brasileiros - a meta são 101 mil bolsas de estudo até 2015 - a frequentarem cursos superiores na área científica e tecnológica no exterior, partindo da constatação de que essa é a via mais rápida para assimilarem novos conhecimentos e adquirirem experiências de outras culturas. A maioria das bolsas, 64 mil, são destinadas a cursos de "graduação sanduíche" (licenciaturas). Surgiu um problema no caminho. O ensino da língua inglesa no Brasil, no ensino público e mesmo no privado, é precário. O francês ainda mais e o alemão ou o mandarim nem se fala... A corrida às bolsas oferecidas pelo governo foi grande. Os destinos propostos eram muitos, da velha Inglaterra à milenar China. Entre eles, também estiveram as universidades portuguesas. Milhares de candidatos não hesitaram na opção por Portugal. Afinal, em português nos entendemos e, não menos importante, o custo de vida é bastante menor que numa cinzenta Londres ou numa cosmopolita e feérica Paris. A corrida ao destino Portugal parece não ter agradado a alguns setores políticos do governo. As intrigas palacianas não tardaram, os lobbies contra apostaram forte e a qualidade do ensino universitário em Portugal foi posta em causa. De um dia para o outro, Portugal foi suspenso do Ciência sem Fronteiras. A diplomacia portuguesa bem se esforçou, mas, aparentemente, a suspensão continua "blindada". A justificativa demorou, mas veio: era necessário que os estudantes brasileiros ganhassem familiaridade com outras línguas além do português. Desde então, nada mudou. Portugal continua destino "tabu". Quinta-feira (21), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) abriu novas inscrições para graduação-sanduíche em 21 países, no âmbito do programa Ciência sem Fronteiras. Os países selecionados pelo governo brasileiro são: Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, China, Coréia do Sul, Espanha, Estados Unidos, Finlândia, França, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália, Japão, Noruega, Nova Zelândia, Polônia, Reino Unido e Suécia. Portugal não faz parte. Questionado sobre o Ciência sem Fronteiras, o ministro Nuno Crato reconhece as dificuldades. "Esse foi um dos problemas que discutimos com os ministros Paim e Campolina. Parece-nos que é altura de rever a posição do governo brasileiro, que tomou a posição de limitar o acesso de candidaturas do Ciência sem Fronteiras às universidades portuguesas". "Embora percebendo os argumentos do governo brasileiro, sempre temos contraposto a elevada qualidade das universidades portuguesas". "Temos insistido que as universidades portuguesas oferecem uma qualidade  de formação reconhecida internacionalmente", diz Nuno Crato. O ministro ressalva que "essa restrição não se aplica à pós-graduação" e acredita que ela será levantada "em breve". Hoje, as universidades portuguesas continuam a ser procuradas por brasileiros, quer para cursos de licenciatura, quer para especializações e pós-graduações, à margem do Ciência sem Fronteiras. Só o campus da Universidade de Coimbra é frequentado por cerca de três mil estudantes brasileiros. Muitos outros estudam em Lisboa, Porto ou Évora. Várias universidades portuguesas têm procurado fazer face à crise económica que atinge o país com a captação de alunos brasileiros. Graças ao estatuto do estudante estrangeiro, recentemente publicado pelo governo, os brasileiros podem ingressar na maioria dos cursos de universidades públicas de Portugal mediante comprovação de aprovação no Enem (Exame Nacional de Ensino Médio), sem terem de passar por qualquer outra prova, e pagamento de uma mensalidade de valor variável conforme a instituição. "Um processo demasiado lento" As dificuldades no relacionamento bilateral na área da educação não se limitam ao Ciência sem Fronteiras. O reconhecimento de títulos acadêmicos continua a ser uma barreira. Embora várias universidades do Brasil reconheçam títulos acadêmicos portugueses, por meio de acordos com instituições de Portugal, o que abre caminho ao exercício profissional num e noutro país, esta ainda é a exceção. Só muito recentemente as autoridades portuguesas começaram a optar por um processo negocial que contempla não apenas, e necessariamente, as conversações com o governo federal mas também os contatos com as entidades representativas das universidades brasileiras, que gozam de grande autonomia e sem cujo aval quaisquer acordos, mesmo que no nível governamental, se tornam praticamente figuras de retórica. "O reconhecimento de títulos académicos continua em discussão, mas melhorou a receptividade por parte do governo brasileiro. Não há um bloqueio total, mas é um processo demasiado lento",  diz o ministro português da Educação. Apesar das dificuldades, há progressos, salienta Nuno Crato.  Na área da ciência e tecnologia, por exemplo, a cooperação entre a Fundação Ciência e Tecnologia de Portugal e a brasileira Capes avança. "Há um projeto de investimento português e brasileiro em nanotecnologia, em desenvolvimento na Universidade de Braga, e um programa de doutoramento em ciências da vida", refere Nuno Crato. Estes e outros temas, como a cimeira da Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, Ciência e Cultura, que decorrerá dia 27 de agosto, na Cidade do México, e a finalização dos estatutos do Centro CPLP-Unesco com sede em Lisboa, sob auspícios da Unesco, foram outros dos temas abordados nas conversações mantidas esta semana pelo ministro e pelo secretário de Estado em Brasília, numa altura em que a ação governativa cede espaço e primazia às campanhas para as eleições gerais de 5 de outubro no Brasil. http://www.portugaldigital.com.br/politica/ver/20088177-nuno-crato-no-brasil-aposta-em-sucesso-de-abertura-de-uma-escola-portuguesa-em-sao-paulo?utm_source=e-goi&utm_medium=email&utm_term=Newsletter+Portugal+Digital&utm_campaign=Portugal+Digital