14-08-2014A PRONÚNCIA DO PORTUGUÊS EUROPEUIntroduçãoUma Língua e sua Variação A língua portuguesa, como qualquer outra, manifesta variações que são notadas se se compararem falantes de países diversos onde o Português é língua nacional e/ou oficial – Portugal, Brasil, Angola, por exemplo – ou falantes de diferentes regiões do mesmo país. A par desta variação geográfica, é incontestável que o Português, como todas as línguas, apresenta também uma variação temporal, ou seja, uma evolução que pode ser conhecida através de diversas fontes e testemunhos.Sendo a língua uma forma preferencial do comportamento humano, é natural que varie no tempo. Tal mudança, denominada diacrónica ou histórica, tem paralelo na mudança dos conceitos de vida de uma sociedade, na mudança das artes, da filosofia e da ciência e, até, na mudança da própria natureza. Pelas mesmas razões fundamentais – a língua como forma de comportamento social e individual, a utilização da língua por grupos de indivíduos separados geograficamente, ou socialmente – todas as línguas apresentam variações no espaço decorrentes da diferente origem geográfica ou social dos falantes.As variações mais evidentes são as existentes entre variedades nacionais como, no caso do Português, as que se notam entre a língua falada em Portugal (Português Europeu, adiante PE), no Brasil (Português Brasileiro, adiante PB), e nos outros países em que foi adoptado como língua oficial: Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.- Mapa dos países e região administrativa especial (Macau) que têm o português como língua nacional ou oficial.Por outro lado, as variedades nacionais de uma língua não apresentam uma uniformidade interna, mas são constituídas por variantes geográficas: os dialectos. No Português Europeu, os dialectos não são muito distintos entre si, talvez por razões de carácter histórico nas quais ressalta o facto de Portugal ser o país europeu com as fronteiras mais antigas.Essa aparente uniformidade fez com que durante muito tempo se considerasse o Mirandês (falado na região de Miranda, norte de Portugal) como o único dialecto do Português, dada a estranheza que as pessoas sentiam nessa forma de falar. Afinal, essa estranheza era devida ao facto de o Mirandês ser um dialecto de uma língua diferente, o Asturiano ou Asturo-Leonês, que tem características distintas do Português. A confusão desapareceu a partir de 1997, ano em que o Mirandês foi considerado oficialmente uma língua minoritária com estatuto reconhecido no território linguístico português. Do mesmo passo, Portugal deixou de ser um país monolingue e os mirandeses passaram a ser indivíduos bilingues.Acrescente-se que o dialecto já não é hoje considerado, como foi em tempos, uma forma ‘diferente’ (e até desprestigiada) de falar uma língua, mas é ‘qualquer’ forma de falar uma língua conforme a região a que pertence o falante. Portanto, todos os indivíduos falam um certo dialecto, correspondente à sua região de origem. Um outro tipo de variação nota-se no uso da língua por diversos grupos socioculturais e socioeconómicos, o que determina a existência dos denominados sociolectos. Dialectos, sociolectos e variedades nacionais são termos com que designamos aspectos da variação de uma língua.- Mapa dos dialectos Portugueses Uma língua ou mais do que uma língua?Poder-se-á perguntar, perante as variantes de uma língua, evidentes para os seus falantes e para os estrangeiros que a não conhecem, por que razão mantemos o mesmo nome para formas de falar que apresentam diferenças? Em que circunstâncias devemos considerar que elas constituem línguas diversas?Existem duas ordens de factores para a manutenção de um mesmo nome – língua portuguesa, francesa, inglesa – cobrindo variantes de diferente tipo. Por um lado, não é possível demonstrar linguisticamente que duas variedades de uma língua passaram a ser línguas distintas em determinado momento da sua evolução por se verificarem certas diferenças fonéticas, morfológicas ou sintácticas, ou por se considerar que os seus falantes manifestam entre si diferenças culturais. Na verdade, há diferenças de vários tipos no interior de uma língua e há semelhanças entre línguas que têm nomes diversos por razões históricas.Por outro lado a manutenção dessas variedades no interior do que se denomina uma língua é, em última análise, uma opção política (como o foi a decisão de tornar o Português, o Francês ou o Inglês línguas oficiais nas antigas colónias depois da respectiva independência). Ou seja, o termo "Língua Portuguesa", que cobre as variedades sociolectais, dialectais e nacionais que convivem em Portugal, no Brasil e nos países onde é língua oficial , deve ser entendido como importante instrumento de coesão entre povos e como afirmação política e económica num contexto nacional e transnacional. Este é um dos mais fortes motivos para que conservemos a denominação de Língua Portuguesa cobrindo todas as suas naturais variantes. Leituras ComplementaresCintra, Luís Filipe Lindley (1971) Nova proposta de classificação dos dialectos galego-portugueses. Boletim de Filologia, XXII, 81-116. Republicado em Cintra, Luís Filipe Lindley (1983) Estudos de dialectologia portuguesa. Lisboa: Sá da Costa Editora, 117-164. www.instituto-camoes.pt/cvc/hlp/biblioteca/novaproposta.pdfFerronha (org.) (1992). Atlas da Língua Portuguesa na História e no Mundo. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, Comissão Nacional para os Descobrimentos Portugueses, União Latina.Lobo, Tânia (1992) Variantes nacionais do Português: sobre a questão da definição do Português do Brasil.www.prohpor.ufba.br/variantes.html.Mateus, Maria Helena Mira (2002) Unidade e diversidade da língua portuguesa. In Mateus, Maria Helena Mira (2002) A Face Exposta da Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda: 15-26.Mateus, Maria Helena (2002) Variação e variedades: o caso do português. Conferência proferida na Universidade Eduardo Mondlane (Maputo) em Maio de 2002 http://www.iltec.pt/pdf/wpapers/2002-mhmateus-variacao.pdfMota, Maria Antónia Coelho da (1996) Línguas em contacto. In Faria, Isabel Hub, Carlos Gouveia, Emília Pedro e Inês Duarte (orgs.) (1996) Introdução à Linguística Geral e Portuguesa. Lisboa, Editorial Caminho: 505-534 Raposo, Eduardo Paiva (1984) Algumas observações sobre a noção de "língua portuguesa". Boletim de Filologia 29: 585-94.Segura, Luísa e Saramago, João (2001) Variedades dialectais portuguesas. In Mateus, Maria Helena Mira (org.) (2001) Catálogo da Exposição Caminhos do Português. Lisboa: Biblioteca Nacional, 221-237. http://cvc.instituto-camoes.pt/cpp/acessibilidade/capitulo1_1.html |