Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


28-08-2013

Eles estão de brincadeira Marco António Villa


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Por MARCO ANTÓNIO VILLA







No já histórico junho de 2013, as ruas foram ocupadas pe­los cidadãos. Foi um grito contra tudo que está aí. Con­tra os corruptos, contra os gastos abusi­vos da Copa do Mundo, contra a impu­nidade, contra a péssima gestão dos serviços públicos, contra a violência, contra os partidos políticos.

Dois poderes acabaram concentran­do a indignação popular: o Executivo e o Legislativo. Contudo, o Judiciário de­ve ser acrescido às vinhas da ira.

Neste mesmo espaço, em 13 de de­zembro de 2011, escrevi um artigo ("Triste Judiciário") tratando do Superi­or Tribunal de Justiça, o autointitulado tribunal da cidadania.

Um ano e meio depois resolvi consul­tar o site do tribunal (www.stj.jus.br) para ver se tinha ocorrido alguma mo­dificação nas mazelas que apontei. Para minha surpresa, tudo continua absolu­tamente igual ou, em alguns casos, pior.

Busquei inicialmente o número de cargos. Vi uma boa notícia. Eram 2.741 em 2012 e em 2013 tinha diminuído pa­ra.... 2.740. Um funcionário a menos pode não ser nada, mas já é um avanço para os padrões brasileiros. Porém, ao consultar as funções de confiança, ob­servei que nos mesmos anos tinham saltado de 1.448 para 1.517.

Fui pesquisar a folha dos funcionários terceirizados. São 98 páginas. Mais de 1.550 funcionários! E tem de tudo um pouco. São 33 garçons e 56 copeiras. Afinal, suas excelências têm um traba­lho desgastante e precisam repor as energias. No STJ ninguém gosta de es­cadas. É a mais pura verdade. São 34 as­censoristas: haja elevadores! Só de vigi­lantes - terceirizados, registre-se - são 264. Por ironia, a empresa contrata­da chama-se Esparta. E se somarmos os terceirizados mais os efetivos, teremos muito mais dos que os 300 espartanos que acompanharam Leônidas até as Termópilas, longe, evidentemente, de comparar suas excelências com o hero­ísmo dos lacedemônios.

Resolvi consultar a folha de paga­mentos de junho. Fiquei só na letra A. Não por preguiça. É que preciso traba­lhar para pagar os impostos que susten­tam os salários das suas excelências.

Será que o tribunal foi isento da aplicação do teto constitucional? Dos cinco ministros que abrem a lista, to­dos recebem salários acima do que é permitido legalmente.

Vamos aos números: António Carlos Ferreira recebeu R$ 59.006,92; António Herman de Vasconcelos e Benjamin, R$ 36.251,77; Ari Pargendler, R$ 39.251,77; Arnaldo Esteves Lima, R$ 39.183,96; e Assusete Dumont Reis Ma­galhães, R$ 39.183,96. Da lista completa dos ministros, a bem da verdade, o re­cordista em junho é José de Castro Meira com o módico salário de R$ 63.520,10. Os ministros aposentados também recebem acima do teto. Paulo Medina, que foi aposentado em meio a acusações gravíssimas, recebeu R$ 29.472,49.

O STJ revogou o artigo 5° da Consti­tuição? Ou alterou a redação para: "To­dos são iguais perante a lei, sem distin­ção de qualquer natureza, exceto os mi­nistros do STT?”

O tribunal é pródigo, com o nosso di­nheiro, claro. Através do que chama de aviso de desfazimento, faz doações. Só em 2013 foram doados dezenas de veí­culos supostamente em estado "anti-econômico." Assim como refrigeradores, mobiliário, televisores e material de in­formática. É o STJ da felicidade. Tam­bém, numerário não falta. Para 2013 o orçamento é de l bilhão de reais. E esta­mos falando apenas de um tribunal. Só para pagamento de pessoal e de encargos sociais estão alceados 700 milhões. Sempre pródiga, a direção do STJ reser­vou para a contribuição patronal da se­guridade social dos seus servidores a módica quantia de 100 milhões (mais que necessário, pois há servidores inati-vos recebendo R$ 28.000,00, e pensio­nistas com R$ 35.000,00).

O tribunal tem 166 veículos (dos quais 20 são ônibus). Por que tantos ve­ículos? São necessários para o trabalho dos ministros? Os gastos nababescos são uma triste característica do STJ. Só de auxílio-alimentação serão destina­dos R$ 24.360.000,00; para assistência médica aos ministros e servidores fo­ram previstos R$ 75.797.360,00; e à as­sistência pré-escolar foram alceados R$ 4.604.688,00. À simples implantação de um sistema de informação jurisdicional foi destinada a fabulosa quantia de R$ 22.054.920,00. E, suprema ironia, para comunicação e divulgação institucio­nal, o STJ vai destinar este ano R$ 14.540.000,00.

A máquina do tribunal tem de funcio­nar. E comprar. Em um edital (e só con­sultei os meses de junho e julho) foram adquiridos 1.224 copos. Noutro, por R$ 11.489,00, foi contratada uma empresa de eventos musicais. Estranhamente fo­ram adquiridos 180 blocos para receitu­ário médico, 50 blocos para ficha odontológica e 60 pacotes - cada um com 100 unidades - de papel grau cirúrgico (é um tribunal ou um hospital?).

É difícil entender a aquisição de 115 luminárias de uma só vez, a menos que o prédio do tribunal estivesse às escu­ras. Pensando na limpeza dos veículos foram adquiridas em julho 70 latas de cera para polimento. Tapetes personali­zados (o que é um tapete personaliza­do?) custaram R$ 10.715,00 e de uma vez compraram 31 estiletes.

Não entendi, sinceramente, a razão de adquirir 3.360 frascos de 1.000 ml ca­da de álcool. E o cronometro digital a R$ 1.690,00? Mas, como ninguém é de fer­ro, foi contratada para prestar serviço ao STJ a International Stress Manegement Association.

Mas, leitor, fique tranquilo. O STJ tem "gestão estratégica" De acordo com o site, o tribunal "concentra esforços na otimização dos processos de trabalho e na gestão da qualidade, como práticas vol­tadas à melhoria da performance insti­tucional e consequentemente satisfa­ção da sociedade! Satisfação da socie­dade? Estão de brincadeira.

 

Marco António Villa é historiador e professor da Universidade Federal de São Carlos (SP)

http://veja.abril.com.br/blog/augusto-nunes/feira-livre/eles-estao-de-brincadeira-um-texto-de-marco-antonio-villa/

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