Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


27-05-2014

O Acordo Ortográfico permitiu unificar a língua portuguesa


 Sérgio Almeida   Guia para uma compreensão rápida e eficaz da língua. Português Atual é o novo livro de Lúcia Vaz Pedro, professora e formadora que assina semanalmente um artigo sobre língua portuguesa noJornal de Notícias.  Cinco anos após a entrada em vigor do Acordo Ortográfico (AO), Lúcia Vaz Pedro afirma não ter dúvidas dos benefícios que o tratado trouxe para os utilizadores, destacando a uniformização da escrita e a maior visibilidade internacional entretanto adquirida.  No próximo mês a autora desloca-se a Macau, a convite do Instituto Politécnico local, para ministrar formação de Português aos professores universitários chineses.
 
Desde que o AO passou a ser uma realidade, foram publicados inúmeros guias e prontuários. Quais acredita serem as mais-valias do seu livro face à ampla oferta já existente?  Este livro não aborda apenas o novo acordo ortográfico. Português Atual é um livro que explica, de forma simplificada, alguns conceitos necessários a uma escrita eficiente, atual e correta.  Que balanço faz da implementação do AO entre nós?
 Julgo que o balanço tem sido bastante positivo. Na verdade, a implementação tem sido feita de forma gradual nas escolas e os alunos aplicam-no com naturalidade assim como os professores. Ao nível da comunicação social e na generalidade das empresas o AO é seguido e aplicado sem dramatismos.  Ao fim deste período de implementação já é possível apontar algumas vantagens que o AO trouxe?
 Tal como era previsível, o AO permitiu unificar a língua portuguesa. Essa unificação tem conduzido a uma política de língua que desperta interesse mundial. O Português transformou-se numa língua mais consistente, com regras bem definidas, nomeadamente no que diz respeito à hifenização.  O Acordo Ortográfico ainda não é uma realidade em todos os países da CPLP. Que razões encontra para o arrastamento do processo?
 Todos sabemos que o problema de alguns países da CPLP se prende com a educação e não com o Acordo Ortográfico em si. Antes de se falar de AO, urge ter uma educação eficiente e que a escolaridade seja uma realidade acessível a todas as crianças. Saber ler e escrever são instrumentos essenciais para o crescimento de qualquer ser humano. Assim, penso que, neste momento, esses países estão a preparar-se para criar as condições para uma educação funcional onde a Língua Portuguesa seja a mesma que é utilizada por milhões de pessoas.  Diz na introdução que o adiamento nunca comprometeu a ratificação do Acordo. Mesmo com todas as críticas e petições existentes, acreditou sempre que o AO acabaria por vingar?
 Sempre acreditei, porque a maioria da sociedade portuguesa e da sociedade brasileira utilizam o Acordo Ortográfico: os manuais escolares, as revistas, os jornais, as legendas dos filmes, os anúncios publicitários. O adiamento permitiu uma harmonização entre Portugal e o Brasil, quanto à data de entrada em vigor obrigatória em ambos os países. Esta sintonia fortaleceu ainda mais este tratado.  Que imperfeições poderiam ser corrigidas numa futura revisáo do Acordo Ortográfico?
 Há algumas situações que poderiam ser revistas, nomeadamente a questão do acento facultativo da 1ª pessoa do plural do pretérito perfeito do indicativo dos verbos da 1ª conjugação, como, por exemplo, estudamos / estudámos; ou então a da 1ª pessoa do plural do presente do conjuntivo do verbo dar ( dêmos ou demos). Isto porque o acento é obrigatório noutras situações, como é o caso da 3ª pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo do verbo poder (pôde) para se distinguir da 3ª pessoa do singular do presente do indicativo (pode). Na verdade, a questão das facultatividades, em vez que facilitar confunde. Existe ainda uma situação que deve ser revista e que se prende com o prefixo co-. Ora este prefixo, segundo as regras do AO prescinde do hífen em qualquer tipo de situação, mas a palavra co-herdeiro surge com a dupla grafia co-herdeiro e coerdeiro. Trata-se de pequenos pormenores que, a seu tempo, serão limados.
 
Faz formação sobre o Acordo Ortográfico. Quais as dúvidas mais frequentes que encontra?
 Por incrível que pareça, quando dou formação, as dúvidas que os formandos apresentam não se prendem com o AO em si, mas com a língua portuguesa em geral. Às dificuldades de escrita acrescem as do desconhecimento do funcionamento da língua e a falta de hábitos de leitura, o que se  traduz em  lacunas difíceis de superar. E é nessas formações que as pessoas tomam consciência da complexidade da nossa língua e de que o AO, pelo menos, conduziu a uma reflexão sobre alguns aspetos que poderão ajudar a racionalizar a sua utilização no dia a dia.  Sente maior abertura dos jovens para assimilarem as mudanças? 
 Os jovens são os que mais facilmente aprendem, compreendem e aplicam o AO. Os manuais escolares têm facilitado a aquisição da nova grafia e ao nível escolar não existe qualquer impedimento.  O meio literário tem sido, na sua maioria, um dos grandes resistentes do AO. A maioria dos escritores ainda adota a anterior grafia. Surpreende-a essa resistência?
 Por um lado, compreendo essa postura. Trata-se de uma tradição. Fernando Pessoa e Teixeira de Pascoaes também rejeitaram a substituição do y grego pelo i latino, aquando do acordo ortográfico de 1911. Julgo que há sempre pessoas que resistem à mudança, seja por receio de não saberem escrever pelas novas regras, seja por elo emocional ou intelectual à memória gráfica da escrita. Porém, não nos podemos esquecer de que a nossa língua está tão viva que saltita pelo mundo. Parece uma criança feliz e não há quem não a queira aprender.

http://www.jn.pt/blogs/babel/archive/2014/05/27/quot-o-acordo-ortogr-225-fico-permitiu-unificar-a-l-237-ngua-portuguesa-quot.aspx?utm_source=dlvr.it&utm_medium=facebook