01-05-2013Visitação por Gilberto CaixetaVisitação Gilberto Caixeta
'O tempo é atemporal em suas visitações. Diferentemente das lembranças. O passado é o presente atuando nas visitações no futuro. É como se fôssemos, nas nossas relações coletivas, um conjunto de partículas dispersas que se distanciam e se reagrupam de tempo em tempo, sem perda da identidade individual daquilo que cada um é na verdade. O individual, o pessoal, aquilo que é próprio de cada um, que lhe caracteriza e o diferencia estarão sempre consigo. Essa síntese individual é o nosso passaporte atemporal. Sempre conosco, inexoravelmente, em visitações. O tempo mostra-nos que, com quem não nos damos são improdutivas e até perigosas as tentativas de convergências nas ações. Para que a pulsação da cobrança não nos visite, deve-se, portanto, evitá-la com gestos de tentativas de convivência, no mais, são perdas de tempo. O conjunto sempre nos visita em lembranças boas ou ruins, mas sempre nos visita. Ao chegar à Clínica Médica, o ambiente era de paz de convento. Longe do convencional de salas de espera de médicos; nas paredes, desenhos a pincel de Ovídio Fernandez, relatando a história da arquitetura uberabense. O local era bucólico demais para não ter tido uma história pregressa de visitações coletivas. Os médicos que hoje atendem ali não têm idade para ter podido frequentar aquele lugar em tempos outrora, quando as recepções que ali ocorriam eram em busca de acalentos diferentes daqueles tidos em casa. São jovens médicos e modernos coabitando um espaço de histórias pregressas. A arte de Ovídio estava na parede. Ele era um artista, um boêmio incorrigível. As paredes da sala de espera daquela clínica o homenageiam e o relembram em alto estilo. Quando o médico Luiz Gustavo Fagundes – angiologia e cirurgião vascular – comunicou à atendente que o próximo podia entrar, o paciente não esperava que mais um novo encontro com o passado se sucederia naquele momento. E aí, professor? Até então nada demais, o título está na ficha preenchida com os dados pessoais. Sentou-se. Era, no entanto, o passado frente a frente com o presente e as suas mutações imparáveis. É como ser convidado a apreciar o tempo e as suas surpresas. Embora não saibamos quando ocorrem os reencontros, eles já estão no tempo, aguardando o dia chegar. Por isso, não insista em apressar os encontros, porque eles estão no tempo certo. Não tente tê-lo antes, porque não se pode antecipar. Quando inimigo, os encontros se dão também, por isso, esteja atento mesmo que ele se apresente como aliado. São partículas que estão ali juntas por uma questão de espaço e tempo, e não de história conjunta. Não são almas pregressas na vivência contemporânea, e sim oportunistas. Fui seu aluno, afirmou o médico. Aquele local, os quadros de Ovídio, a atendente que era funcionária da Igreja São Domingos, onde ele era um assíduo participante, era a síntese. Era o passado no presente. Todos na convergência do paciente a apontar o futuro quando deixasse o local.
(*) gilcaixeta@terra.com.br
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