02-07-2010As grandes linhas da política de acolhimento e integração de imigrantes em PortuAs grandes linhas da política de acolhimento e integração de imigrantes em PortugalRui Marques Alto Comissário para a Imigração e Minorias ÉtnicasPortugal, depois de uma longa história de país de origem de emigrantes, que ainda continua a ser, tornou-se, no final do século XX, também um país de acolhimento. Hoje, diferentes comunidades, onde se destacam os imigrantes brasileiros, ucranianos e caboverdianos, constituem já 5% da população residente em Portugal (cerca de 500.000 imigrantes legais) e 8% dos activos. O crescimento destas comunidades verificou-se essencialmente a partir do início dos anos 90, quando só existiam cerca 100.000 imigrantes, o que reflecte um aumento de 400% em quinze anos. Portugal beneficiou nas últimas décadas desta presença de imigrantes que contribuíram significativamente para o processo de desenvolvimento acelerado que o nosso País viveu. A sua contribuição de 5% para o Valor Acrescentado Bruto (VAB) nacional, com particular destaque para os sectores da Construção Civil (15%); Hotelaria e Restauração (11%) e Serviços e Empresas 10%)i; o saldo positivo da sua contribuição para as contas do Estado – 243 milhões de euros, em 2002 – ou ainda a contribuição para o equilíbrio da pirâmide demográfica, são alguns exemplos evidentes do contributo que os imigrantes nos trazem. Mas importa sublinhar também o enriquecimento decorrente da diversidade cultural e religiosa introduzida pelas comunidades imigrantes pois a “diversidade cultural é uma das fontes de desenvolvimento, entendido não só como crescimento económico, mas também como meio de acesso a uma existência intelectual, afectiva, moral e espiritual satisfatória ii . Este novo contexto exigiu da sociedade portuguesa o desenvolvimento de uma política de acolhimento e integração de imigrantes mais consistente, coordenada, desde 1996,pelo Alto Comissariado para a Imigração e Minorias Étnicas (ACIME), órgãodependente do Primeiro Ministro e do Ministro da Presidência. É-lhe atribuída como missão “promover a integração dos imigrantes e minorias étnicas na sociedade portuguesa, assegurar a participação e a colaboração das associações representativas dos imigrantes, parceiros sociais e instituições de solidariedade social na definição das políticas de integração social e de combate à exclusão, assim como acompanhar a aplicação dos instrumentos legais de prevenção e proibição das discriminações no exercício de direitos por motivos baseados na raça, cor, nacionalidade ou origem étnica.”iii Esta opção de desenho institucional, ao colocar a responsabilidade da política de integração no centro do Governo, reflecte a importância que lhe foi atribuída e a visão global e integradora das várias áreas temáticas que lhe está subjacente. Ao invés de colocar esta função sob a tutela da Segurança interna ou do Trabalho e assuntos sociais, assume-se como temática transversal a todas as áreas do Governo. Sete princípios-chaveA política de acolhimento e integração de imigrantes em Portugal é orientada por sete princípios-chave que influenciam directamente os programas e as acções concretas que diferentes instituições públicas desenvolvem ao serviço dos imigrantes.
o acesso aos direitos fundamentais. Por outro lado, a Rede Nacional de Informação ao Imigrante, proporciona em diversas línguas e diferentes suportes (papel, web, media, telefone, postos informativos) informações úteis e práticas que facilitam a integração dos imigrantes. De sublinhar ainda, neste domínio, as acções de ensino de Português dinamizadas pelo Programa Portugal Acolhe. Importa também, neste domínio, não ignorar a presença de imigrantes em situação irregular. Se é certo que a imigração deve ser legal e a lei deve ser respeitada, combatendo-se os circuitos de exploração da imigração irregular, também não pode ser esquecido que a dignidade da pessoa humana se mantém intocável e deve ser protegida contra as adversidades mais extremas. Isso exige a constituição de um núcleo de direitos essenciais devidos a qualquer pessoa, independentemente da sua situação documental. Sublinham-se a título de exemplo na nossa experiência, a importância da consolidação do acesso a cuidados essenciais de saúde, do abrigo temporário em situação de emergência ou do retorno voluntário ao seu país de origem. Mas também importa proporcionar-lhes um apoio jurídico competente e solidário que defina, com rigor e justiça, a sua situação, pois o desconhecimento da lei e dos seus direitos leva-os, a muitos deles, a uma situação de irregularidade por ignorância ou falta de recursos de defesa. E quando não resta alternativa ao afastamento forçado, também esse pode ser feito com humanidade e respeito. 3. O exercício da Igualdade conduz-nos naturalmente ao princípio da plena Cidadania. Ainda que não-nacional, defendemos que o imigrante é um cidadão de pleno direito. É construtor activo de uma comunidade de destino, ainda que não tenha uma origem comum. Mesmo as restrições ainda colocadas ao nível da participação política, devem progressivamente desaparecer, pois não chega a participação política ao nível autárquico que a Constituição Portuguesa já prevê, em regime de reciprocidade. Forma suprema de acesso à cidadania, a aquisição da nacionalidade portuguesa tornou-se também mais fácil, na recente alteração da Lei da Nacionalidade, com particular destaque para os descendentes de imigrantes que agora beneficiam de várias possibilidades de chegarem à nacionalidade portuguesa. 4/5. Esta visão tem como outra consequência na política de imigração, a afirmação dos princípios da Co-responsabilidade e da Participação. Só se constrói uma sociedade inclusiva através do respeito pelo princípio da plena participação cultural e política de todos os cidadãos -nacionais e imigrantes -que constituem, num determinado tempo e espaço, uma sociedade. Os imigrantes devem ambicionar essa participação e, sobretudo, a sociedade de acolhimento deve estar aberta a essa participação na polis. Desta forma, é esperado que os imigrantes, enquanto cidadãos, sejam participantes e coresponsáveis pelo Bem comum e, particularmente na política de imigração, sejam parte da solução. A força do seu movimento associativo, a presença de mediadores socioculturais das comunidades imigrantes em serviços públicos e a voz dos seus representantes no Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração, órgão que aconselha o Governo nas políticas de imigração são alguns exemplos já concretizados.
Estes sete princípios são mobilizadores, quer para o Estado, quer para a sociedade civil . Defendemos que o Estado deve assumir-se como principal aliado da integração dos imigrantes. Este objectivo só pode ter sucesso se respeitado o princípio da permanente cooperação entre diferentes instituições do Estado, procurando respostas articuladas, transversais e multisectoriais. Particular atenção deve ser dada à dimensão local do acolhimento, promovendo uma integração de proximidade. Em simultâneo, é fundamental reforçar a aliança com instituições da sociedade civil, potenciando a sua intervenção generosa, flexível e, normalmente, mais eficiente. Portugal está ainda a aprender a ser país de acolhimento de imigrantes. A sua política de integração precisa ser desenvolvida e consolidada. Temos muito a fazer e a melhorar. Mas este é um desígnio prioritário e sabemos o que queremos. No século XXI, a política de imigração será um dos indicadores que definirá cada Sociedade: “diz-me que política de imigração tens e dir-te-ei quem és”. E cada uma das nossas sociedades precisa de estar atenta, para que um dia não se envergonhe de quem é. i In Sousa Ferreira, Eduardo et al (2004) Viagens de Ulisses – Efeitos da imigração na economia portuguesa , Observatório da Imigração, Lisboa. ii Art. 3º da Declaração Universal da Diversidade Cultural. (UNESCO, 2001) iiiArtº 1º, nº 2, DL 251/2002 |