Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


01-05-2014

Beatrix Heintze, etnóloga: Angola nos séculos XVI e XVII. Estudos sobre Fontes, Métodos e História


Beatrix Heintze Angola nos séculos XVI e XVII. Estudos sobre Fontes, Métodos e História  Beatrix Heintze: o seu longo caminho para Angola A etnóloga alemã Beatrix Heintze, que trabalha há 40 anos em assuntos ligados à Angola dos sec. XVI e XVII, é pouco conhecida em Portugal e relativamente pouco citada. No entanto, este ano foi escolhida para correspondente da classe de Letras da Academia das Ciências de Lisboa. A partir da independência de Angola e após o fim da guerra civil, tem-se relacionado com gente de Luanda, onde agora foi editado este livro, republicando com acrescentos uma série de artigos que tinha publicado ao longo dos últimos decénios.Sendo embora poliglota, a autora só deveria estar à vontade a redigir em alemão, o que dificultava algo a difusão da sua obra. Por isso, foi conhecida em Portugal, sobretudo através  de traduções para português, inglês e francês, nem sempre completas e, por vezes, indevidamente truncadas. Daí a utilidade deste livro que inclusive traduz para português alguns textos que apenas existiam em alemão. Só é pena que um mínimo de cooperação cultural luso-angolana não tenha permitido uma co-edição que tornasse o livro mais barato e não obrigasse uma obra, impressa em Viseu, a ser levada para Angola. Aliás, o livro não aparece à venda em Lisboa.Valerá a pena folhear uma pouco a vida da autora, de que ela não faz segredo, pois publicou em 2007, na revista de que foi editora, a Paideuma, um extenso artigo autobiográfico com o título sugestivo de “O meu longo caminho para “Angola”.Nasceu ela no início da guerra em Korneuburg, na Áustria, em 13 de Janeiro de 1939, filha de pais alemães. O seu pai Hans-Georg Heintze foi mobilizado para a guerra; feito prisioneiro dos russos em Estalinegrado, esteve vários anos dado como desaparecido e foi depois libertado apenas em 1955. A mãe, com dois filhos para criar, foi evacuada em 1944 para Leipzig, para junto dos pais dela.  O seu avô materno, Walter Cramer, foi preso dois dias após o atentado contra Hitler de 20 de Julho de 1944, condenado à morte e executado em 14 de Novembro de 1944; todos os seus bens foram confiscados. É hoje considerado um herói da luta contra o nazismo. B. Heintze escreveu vários textos sobre ele, depois da reunificação (Wiedervereinigung) da Alemanha, quando teve acesso à documentação existente em Leipzig. A sua memória é lembrada num monumento no Johanna-Park, em Leipzig, inaugurado em 1996.Passando por dificuldades económicas, sua mãe enviou-a para junto dos avós paternos, em Hannover, já que era na altura ainda permitido passar a fronteira de leste para oeste aos menores de 14 anos. Ali acabou o Liceu (Abitur) na Primavera de 1959. A sua mãe gostaria de a ver seguir Direito. Mas a leitura de “Winnetou” de Karl May (1842-1912), seguida de outros livros sobre os indianos da América, deixou-a apaixonada pela Etnologia. Conseguiu autorização dos pais para se dedicar a este ramo, desde que estudasse ao mesmo tempo Filologia Românica, História e Filosofia.Iniciou em Munique os estudos universitários no ano lectivo 1959/1960. Em Etnologia, trabalhou com Hermann Baumann que desviou a sua atenção para África central. Foram também seus professores Johannes W. Raum e László Vajda. Note-se que H. Baumann tinha feito investigação em Angola em 1930 e 1954 e publicado um livro sobre a Lunda.No semestre do Verão de 1968, terminou B. Heintze o seu doutoramento com a tese “Besessenheitsphänomene im Mittleren Bantu-Gebiet”.Não sendo fácil arranjar emprego como etnóloga, conseguiu ela um lugar no célebre Frobenius-Institut da Johann Wolfgang Goethe-Universität, em Frankfurt, dirigido por Eike Haberland; diz ela que o obteve primeiro por recomendação de H. Baumann, mas também porque agradara a Haberland um artigo que publicara no ano anterior ao doutoramento na revista Antropos, “Der südrhodesischedziva-Komplex”.Ainda em 1968/1969, veio a Lisboa com uma bolsa da Fundação C. Gulbenkian e uma ajuda material do DFG (Deutsche Forschungsgemeinschaft)com o tema “Realeza em Angola”, sugerido por Haberland. Na altura, a guerra de libertação impedia a investigação no terreno em Angola; e o mesmo aconteceu depois de 1974, com a guerra civil. B. Heintze descobriu então em Lisboa a enorme massa de documentos existentes em relação aos primeiros séculos da ocupação de Angola. Diz ela que na altura era ainda uma “página em branco” para os portugueses, o que lhe permitia consultar à vontade toda a documentação existente. Constatou que tudo o que aqui se publicava sobre Angola tinha implícita ou explicitamente na base o ponto de vista do poder colonial. O comércio de escravos era e permaneceu por muitos anos um completo tabu. O trabalho de etnóloga que até ali se propusera levar a cabo, seria impossível. Teria de estudar as fontes existentes para construir uma base histórica. Nisso teve o apoio de Haberland.leia mais emhttp://www.arlindo-correia.com/020109.html