04-09-2008 A diferença entre Portugal e o Brasil no interesse pela nossa língua comum
[Lusofonias]
A diferença entre Portugal e o Brasil no interesse pela nossa língua comum
D´Silvas Filho
O Brasil vai publicar, em Novembro deste ano, um novo vocabulário, por eles designado Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP), edição da sua Academia Brasileira de Letras (ABL). Estará adaptado ao novo Acordo e terá 370 000 entradas.
O anterior VOLP da ABL foi publicado em 1998, tinha 350 000 entradas. Ou seja, não obstante o avultado investimento no VOLP de 1998, o Brasil está disposto a investir novamente num trabalho semelhante, só decorridos dez anos, e ainda mais ambicioso. Como está previsto que o novo Acordo entre em vigor no Brasil já no próximo ano (para as escolas plenamente em 2012), os nossos irmãos não perdem tempo nestas questões da língua.
A importância deste vocabulário actualizado é fundamental para a entrada em vigor do novo Acordo, conforme já eu dizia na minha nota "Novo acordo. O próximo futuro", publicada em 2008-04-03 na www.dsilvasfilho.com > Linguística > Problemas ortográficos. É indispensável esclarecer palavra a palavra algumas dúvidas que ficam das regras gerais do acordo de 1990 e estabelecer quais as únicas duplas grafias que serão consideradas oficialmente indispensáveis. Os brasileiros dizem que, sem sair o novo VOLP, "ninguém põe a mão no fogo".
Comparando com a acção de Portugal, que fizemos nós do mesmo género? A Academia das Ciências de Lisboa publicou um completo vocabulário em 1940, depois um resumido em 1970; e, em 2001, finalmente deu o nome a uma obra de só 70 000 entradas, publicada por uma editora privada. Entre nós, já há editoras a "pôr a mão no fogo", mesmo sem um vocabulário oficial de apoio (certamente porque não contam para nada com o apoio oficial).
Assim como o VOLP brasileiro considerará como entradas preferenciais as variantes brasileiras, com as portuguesas em alternativa (também legais mas não preferenciais); da mesma forma deveríamos ter um VOLP para o português europeu. Em rigor, portanto, deve haver um VOLP(B) e um VOLP(E), a partir dos quais e com a colaboração dos restantes países da lusofonia se elaborará o Vocabulário Comum Ortográfico da Língua Portuguesa, imposto no preâmbulo do Acordo de 1990.
Ora ainda há pouco tempo, interpelada pessoalmente a Academia das Ciência de Lisboa sobre o andamento do nosso trabalho num VOLP(E) para que o acordo possa avançar correctamente entre nós, foi dito que a Academia não tinha dinheiro para uma obra dessas.
Pode-se incriminar o Brasil por avançar sozinho com o seu VOLP? Pode-se censurar o Brasil se rapidamente estiver em condições de fornecer obras escritas no novo acordo em todos os países que o adoptarem? Muito esperaram eles pela nossa decisão, e poderiam ter avançado só com Cabo Verde e São Tomé…
Em resumo, como eu previa também no artigo acima citado, iremos ter correctores ortográficos e dicionários que terão de tomar como base o VOLP brasileiro. Isto com o risco de haver erros nas variantes portuguesas (num último artigo brasileiro afirmava-se que o novo acordo prescrevia autoestrada sem hífen, porque já era essa a grafia em Portugal…)
Depois, teremos a comunidade linguística portuguesa a dizer, e com razão, que as nossas variantes foram absorvidas pelas brasileiras e que perdemos a identidade nacional na língua.
A diferença entre a forma como os brasileiros estimam a sua língua e o menor interesse dos governantes portugueses está bem patente neste dinamismo brasileiro. Há já ao menos verbas destinadas ao nosso trabalho de casa, no novo Acordo, com o VOLP(E)? Está nomeada a comissão técnica para o elaborar? Ou só há dinheiro para as grandes obras, politicamente significativas?
Cuidar que o país seja engrandecido deve ser uma preocupação de governantes merecedores do cargo que ocupam. Ora enobrecer o património hereditário linguístico é um dever cívico, como respeitar a bandeira. Não basta repetir com orgulho que a "minha Pátria é a minha língua" ou procurar meritoriamente divulgá-la no estrangeiro. É preciso que haja amor e cuidado com a própria língua, no ensino dos jovens, na cruzada contra a sua adulteração, nos riscos de perdas de índole nas mudanças com o tempo. Este imenso amor pela nossa "comum língua" que o Brasil nos mostra nestas suas precauções antes de o Acordo de 1990 entrar em vigor.
Diferenças neste texto para o novo Acordo
Termos para Portugal: atualizado, corretamente, corretores, ação, adotarem, Para o Brasil: Linguística, linguístico
NOTA: as duplas grafias não implicam alterações obrigatórias na escrita.
18/07/2008
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