18-12-2007 Timor Leste: Espírito de Natal Ângela Carrascalão
Espírito de Natal Ângela Carrascalão, Timor-Leste
A religiosidade e a festividade desta época do ano andam de mãos dadas com um visível consumismo, devendo ser esta a única altura do ano em que os timorenses mercê de verdadeiro milagre da “multiplicação” dos seus parcos proventos enchem os upermercados em busca de produtos próprios da grande festa natalícia. Com a proximidade do Natal, a azáfama é enorme nos bairros onde os jovens se esmeram na preparação dos presépios, uma herança que ficou dos tempos da ocupação indonésia, quando, a par de outros subterfúgios com o mesmo objectivo, eram utilizados para manifestação da identidade timorense, marcando-se desta forma a diferença do ocupante. Os moradores de cada bairro contribuem para a construção desses presépios. Surgem pequenas cabanas, de chão atapetado de relva ou de pedras brancas, por vezes rodeadas por um minúsculo jardim. O espaço é vedado a bambu ou com toros de madeira e a decoração está dependente do engenho e da arte de cada grupo. Mal estejam prontos, passam a ser, até à entrada do novo ano, a sala de visitas dos jovens que ali passam os dias e grande parte da noite em amena cavaqueira, quiçá em busca de necessário esquecimento de outros dias menos felizes, das dificuldades de uma vida falha de objectivos, quiçá talvez matando saudades dos tempos em que eram mais crianças e ouviam os mais velhos falando da Resistência, do adversário estrangeiro conhecido pela prática da violência como forma de vida, da unidade dos timorenses conseguida porque necessária para o êxito da luta, da unidade nascida em tempos que são já História, quase considerada hoje como algo fora de moda, saloia e sem préstimo… Naturalmente que hoje os tempos são outros. Não há unidade mas há violência. E, sem a certeza de antigamente, ainda se vai falando do adversário estrangeiro como a raiz dos nossos problemas, quanto mais não seja pela violência deixada como herança desses tempos de cólera… Porém, ainda que timidamente, no desfecho do sempre difícil processo de reconhecimento de culpa própria … - começamos a interiorizar que nós, timorenses, somos em grande parte os culpados dos sarilhos em que estamos metidos. Como encontrar uma saída? Talvez fosse bom inspiramo-nos nos doces tempos de Natal e trabalharmos pela Paz, pela estabilidade, pela concórdia; Se calhar, era bom que voltássemos a estar unidos e nos consciencializá ssemos de que todos não somos demais para reconstruir a Nação timorense; talvez, devêssemos começar a cultivar o respeito e a tolerância pelo adversário político, seja ele estrangeiro ou nosso compatriota; provavelmente deveremos ser mais humildes; talvez fosse positivo compenetrarmo- nos de que temos muito a aprender até com os jovens que – fazendo tréguas de uma luta sem sentido herdada de uma outra cuja razão de ser já quase ninguém se lembra … - preparam com esmero e arte os seus presépios de rua, numa clara manifestação de que eles, os jovens, também são capazes de construir coisas boas… Ângela Carrascalão Segunda-feira, Dezembro 17, 2007
Divulgado no grupo Timor Crocodilo Voador
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