Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


21-02-2022

UM ANTIFASCISTA Português que lembramos hoje : Rómulo de Carvalho(1906-1997)




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Rómulo de Carvalho (1906-1997), professor de Ciências Físico-Químicas (para muita gente mais conhecido por António Gedeão, o poeta de “Pedra Filosofal”), é um símbolo inigualável da cultura científica em Portugal. Além de professor de ciências e de poeta, juntando na mesma pessoa duas sensibilidades diferentes, foi um notável divulgador científico e um historiador da ciência, da pedagogia e, em geral, da cultura portuguesa.RÓMULO Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra

Poema para Galileu declamado por Rómulo de Carvalho mais conhecido por António GedeãoPoema para Galileu . António Gedeão

 

   

Poema para Galileu . António Gedeão

 

 

António Gedeão: Poema para Galileu

Estou olhando o teu retrato, meu velho
pisano,

aquele teu retrato que toda a gente
conhece,

em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce

sobre um modesto cabeção de
pano.

Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.

(Não, não, Galileo! Eu não disse Santo Ofício.

Disse Galeria dos Ofícios.)

Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da

requintada Florença.

Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della
Signoria...

Eu sei... Eu
sei...

As margens doces do Amo às horas pardas da
melancolia.

Ai que saudade, Galileo
Galilei!

 

Olha. Sabes? Lá em Florença

está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.

Palavra de honra que está!

As voltas que o mundo dá!

Se calhar até há gente que pensa

que entraste no calendário.

 

Eu queria agradecer-te, Galileo,

a inteligência das coisas que me
deste.

Eu,

e quantos milhões de homens como eu

a quem tu esclareceste,

ia jurar - que disparate, Galileo!

- e jurava a pés juntos e apostava a cabeça

sem a menor hesitação
-

que os corpos caem tanto mais depressa

quanto mais pesados são.

 

Pois não é evidente, Galileo?

Quem acredita que um penedo caia

com a mesma rapidez que um botão de camisa ou que um seixo da praia?

Esta era a inteligência que Deus nos
deu.

 

Estava agora a lembrar-me, Galileo,

daquela cena em que tu estavas sentado num escabelo

e tinhas à tua frente

um friso de homens doutos, hirtos, de toga e de capelo

a olharem-te severamente.

Estavam todos a ralhar contigo,

que parecia impossível que um homem da tua idade

e da tua condição,

se estivesse tomando num perigo

para a Humanidade

e para a Civilização.

Tu, embaraçado e comprometido, em silêncio mordiscavas os lábios,

e
percorrias, cheio de piedade,

os rostos impenetráveis daquela fila de sábios.

 

Teus olhos habituados à observação dos satélites e das estrelas,

desceram lá das suas alturas

e
poisaram, como aves aturdidas - parece-me que estou a vê-los -,

nas faces grávidas daquelas reverendíssimas
criaturas.

E tu foste dizendo a tudo que sim, que sim senhor, que era tudo tal qual

conforme suas eminências
desejavam,

e dirias que o Sol era quadrado e a Lua pentagonal

e que os astros bailavam e entoavam

à meia-noite louvores à harmonia universal.

E juraste que nunca mais repetirias

nem a ti mesmo, na própria intimidade do teu pensamento, livre e
calma,

aquelas abomináveis heresias

que ensinavas e escrevias

para eterna perdição da tua alma.

Ai, Galileo!

Mal sabiam os teus doutos juízes, grandes senhores deste pequeno
mundo

que assim mesmo, empertigados nos seus cadeirões de braços,

andavam a correr e a rolar pelos espaços

à razão de trinta quilómetros por segundo.

Tu é que sabias, Galileo Galilei.

Por isso eram teus olhos
misericordiosos,

por isso era teu coração cheio de piedade

piedade pelos homens que não precisam de sofrer, homens ditosos

a quem Deus dispensou de buscar a verdade.

Por isso estoicamente,
mansamente,

resististe a todas as torturas, a todas as angústias, a todos os
contratempos,

enquanto eles, do alto inacessível da suas
alturas,

foram caindo,

caindo,

caindo,

caindo,

caindo
sempre,

e
sempre,

ininterruptarnente,

na razão directa dos quadrados dos tempos.

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RÓMULO Centro Ciência Viva da Universid...

 

 

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Poema para Galileu . António Gedeão