Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


19-01-2022

A CONQUISTA DE CEUTA por Rainer Daehnhardt


D. Mécia Vasques, aia dos filhos de D. João I, viveu com a Família Real Portuguesa, acompanhando as suas tristezas e alegrias. Também foi mãe de um excepcional português. Trata-se de Vasco Fernandes de Ataíde, um cavaleiro destinado a proteger o Infante D. Henrique. Assim, quando este Infante, ainda jovem, acompanha seu irmão mais novo e seu pai na tomada de Ceuta (1415), Vasco Fernandes de Ataíde, na qualidade de governador da casa do Infante, também o acompanha.

Durante a batalha e perante a superioridade numérica do adversário, acabaram as forças portuguesas por se dividir, surgindo assim uma grande quantidade de combates individuais.

O Infante D. Henrique entusiasmou-se com os resultados obtidos com a sua espada e, perseguindo alguns adversários que preferiram a fuga, acabou por se afastar significativamente dos diferentes grupos de portugueses, chegando a haver dúvidas sobre se ainda estaria vivo ou não.

Em grande aflição, Vasco Fernandes de Ataíde combatia os mouros que se encontravam entre ele e o lugar onde se supunha estar o Infante. Acabou por se lhe juntar no momento decisivo.

Os mouros já se tinham apercebido do atrevimento desmesurado do filho do rei cristão e cercando-o, já o consideravam presa fácil. A vinda de Ataíde fez pender o fiel da balança para o lado português e os dois conseguiram salvar-se de situação bem difícil. Tudo isso se deu junto à muralha de Ceuta, sob o olhar dos mouros que ainda defendiam a fortaleza. Um deles deixou então cair uma grande pedra na cabeça de Ataíde, que faleceu instantaneamente.

O desgosto dos portugueses foi imenso e nem a tomada de Ceuta o veio quebrar. O Infante, em sinal de luto, deixou de fazer a barba durante um ano e três meses.

É o Rei em pessoa quem conta à mãe que perdera o filho na conquista e, ela, só queria que lhe dissessem como. Posta ao corrente, ela vira-se para o Infante que tristíssimo e inconsolável voltara com péssimo aspecto, e diz-lhe:

Ah! Senhor, mas o que é isto? Onde está a vossa virtude real, a vossa alteza e também a vossa juventude? Porque chorais e estais enlutado como uma mulher? Isso não vos fica bem.

Sou eu quem deve chorar, sou eu quem deve estar de luto pela morte do meu único e bom filho que jamais voltarei a ver. Mas a vós, Monsenhor, não vos poderão faltar servidores que vos servirão tão bem e melhor, pelo que vos suplico que recobreis o ânimo.

D. Mécia Vasques, a aia do Infante D. Henrique, ao receber a notícia da morte do seu único filho, assume o lugar de consoladora, perante a profunda tristeza do Infante.

Uma grande mãe e grande portuguesa, cujo sentido de prioridades nem a pior das circunstâncias conseguiu abalar.

in "MULHERES DE ARMAS E CORAGEM", Rainer Daehnhardt

Consultar: https://www.apeiron-edicoes.com/.../mulheres-de-armas.../...

 

Rainer Daehnhardt Inline image
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É descendente de uma família de diplomatas e militares alemães radicados em Portugal desde 1706.

Fez os seus estudos na Alemanha e em Portugal, especializando-se no estudo de armaria.

Preside a Sociedade Portuguesa de Armas Antigas desde 1972, representando Portugal em congressos internacionais e dando conferências em muitas instituições europeiasamericanas e asiáticas. É membro da Arms and Armour Society de Londres, da Gesellschaft für Historische Waffen und Kostümkund de Berlim e da Rowland Society. É membro honorário da ASAC (American Society of Arms Collectors) dos EUA.

É autor de livros e artigos, na sua maioria ligados à armaria antiga e à História de Portugal. Durante muitos anos, teve uma loja sobre estes temas em Cascais, que entretanto fechou.