Iclas - Instituto de Culturas Lusófonas
Antonio Borges Sampaio


11-11-2002

Trajetória dos Judeus em Portugal - www.ledorvador.com.br


Da riqueza histórica,  pioneira e afetiva do relacionamento judaico portugues ( com um tempero bem brasileiro), nasceu este trabalho sensacional e unânime quanto a qualidade e sensibilidade e o resultado é um documentário nascido por entre os vales das aldeias portuguesas.

 

 A seguir vocês vão conhecer um pouco dessa história contada especialmente para LeDor VaDor, por suas autoras, Elaine Eiger – Paulista , fotógrafa e videomaker. Lançou em 2000, com a jornalista Luize Valente, o livro "Israel Rotas e Raízes " resultado de sua quarta viagem a Israel. Possui um acervo com mais de dez mil cromos e negativos de viagens pelo mundo. Atualmente desenvolve um trabalho de foto memória (restauração de fotos antigas de acervos públicos e particulares). Há mais de dez anos realiza experimentos com imagens eletrônicas unindo técnicas de vídeo, computação gráfica e fotografia com produção direcionada ao mercado de artes plásticas. Participou do projeto "Cem Anos de Paulista", na Casa das Rosas, com a exposição "Olhar do Passante - Percurso Plástico da Avenida Paulista". Realizou , ao lado da artista plástica Maria Bonomi ,o vídeo "TEMPO -VÍDEO -PENTE", para o 3o Studio Internacional de Tecnologias de Imagem, no Sesc Pompéia ; e Luize Valente - Carioca , jornalista com mestrado em Literatura Brasileira pela PUC/RJ . Editora de texto em televisão, mora há quatro anos em São Paulo. Em 1998 foi editora na TV Globo/SP e trabalhou com a jornalista Maria Cristina Poli na edição da série " Centro em Quatro Estações", exibida pela TV Cultura no mesmo ano. De 1999 a 2001 foi editora do programa "Circular" , do Canal 21/ TV Bandeirantes. . Em 2000 lançou, com a fotógrafa Elaine Eiger , o livro "Israel Rotas e Raízes". Iniciou a carreira em televisão há 14 anos na TV Globo/RJ , trabalhando depois nas TVs Bandeirantes e Manchete . Nos últimos três anos no Rio de Janeiro foi editora de matérias internacionais do canal à cabo GNT, da Globosat.

 



O Embarque e o Objetivo

 Em setembro de 2000 embarcamos para Portugal com o intuito de descobrir os resquícios da presença judaica no país de nossos colonizadores. A Inquisição ( Espanha/ 1492, Portugal / 1497) faz parte do currículo escolar mas pouco sabemos do destino que tiveram os judeus que escaparam das fogueiras do Santo Ofício. Diferente do que ocorreu na Espanha onde foram totalmente expulsos ou dizimados, em Portugal eles foram submetidos a conversão. Daí a origem do termo cristão–novo tão popular no Brasil.

Milhares de portugueses que embarcaram nas primeiras caravelas eram judeus convertidos. A pena imposta era a extradição para a nova colônia. Trouxeram na bagagem costumes judaicos - faxina às sextas-feiras, enterro na mortalha, banho aos sábados - principalmente para o nordeste. Muitos sobrenomes comuns por aqui têm origem na conversão: Silva, Cardoso, Oliveira, Pereira , Nunes, Mendes, Azevedo , etc . Da mesma forma, palavras como mesura ( de Mezuzah) , azeite ( de zeit ) e muitas outras vêm do hebraico. Portugal no período pré –inquisição chegou a ter 10% da população de origem judaica – cerca de 100 mil judeus! Para se ter uma idéia hoje, 500 anos depois, o Brasil tem 150 mil judeus.

Tradição Secreta - De Geração em Geração 

Enfim o documentário faz um percurso por todo o território português – entramos pelo Algarve , no Sul e saímos pelo Minho , no norte – mostrando locais e curiosidades...até hoje encontramos nas pequenas aldeias cruzes gravadas nas portas das casas - sinal da conversão - e buracos onde se colocava a Mezuzah.

Outra curiosidade é culinária : a alheira, famosa lingüiça portuguesa feita com frango e miolo de pão foi criada pelos conversos que mantiveram a tradição judaica secretamente ( os chamados marranos). As linguiças eram penduradas na porta de casa para que se pensasse que ali se comia carne de porco! Como a Inquisição permaneceu por três séculos em Portugal – só foi abolida em 1821- o fenômeno do marranismo se tornou um caso único no judaísmo. As tradições eram passadas oralmente, pelas mulheres, as rezas adaptadas e os judeus batizados . Tinham santos ( Santa Esther e São Moisés) e acendiam as velas de shabat dentro de armários. Aliás , os marranos portugueses – concentrados principalmente na aldeia de Belmonte, norte de Portugal ( terra de Pedro Álvares Cabral) – só foram descobertos em 1930 por um judeu polonês que foi morar em Portugal. O engenheiro de minas Samuel Schwarz foi quem revelou ao mundo a existência desta comunidade secreta de judeus. Os marranos ainda viviam em comunidade fechada, mesmo com o fim da Inquisição e não sabiam que era o judaísmo a religião que seguiam!  

Nas Aldeias: Trabalho de Artesãs

Nossa equipe foi composta por duas pessoas : Elaine, fotógrafa e Luize, jornalista. Alugamos um carro e rodamos Portugal num trabalho de garimpo mesmo. No percurso encontramos a arqueóloga Carmem Balesteros que nos levou a escavações de sinagogas medievais. Todas as descobertas são recentes e casuais. Estas sinagogas haviam sido transformadas em Igrejas , depois em armazéns ou depósitos e só no século XX foram sendo "reconhecidas" como lugares originariamente judaicos. Além da arqueóloga foi de fundamental importância a consultoria da professora Anita Novinsky, a maior especialista em Inquisição Portuguesa no Brasil. É ela quem pontua o documentário com as informações históricas contadas de uma forma não acadêmica .

O documentário é todo feito com câmera na mão seguindo a idéia de trajetória marcada no título : " Caminhos da Memória". É todo sonorizado com música ladina , tradicional dos judeus da Península Ibérica. A trilha é original e foi composta pelo grupo carioca Longa Florata.

O Tema do Documentário

O vídeo faz um percurso por cinco séculos da História de Portugal resgatando a memória judaica do país, um tema que está diretamente ligado a colonização do Brasil. Milhares de portugueses que desembarcaram em território brasileiro durante os séculos XVI, XVII e XVIII eram judeus - ou descendentes de judeus - forçados à conversão em Portugal após 1497. Ficaram conhecidos como cristãos novos. Estudos genealógicos mostram que vários sobrenomes comuns em nosso país - Silva, Pereira, Oliveira, Cardoso, Lopes, Azevedo, etc - pertencem a famílias de convertidos.

O documentário "Caminhos da Memória" procura mostrar onde tudo começou . É um resgate das raízes judaicas portuguesas que podem ser apontadas como fundamentais na formação étnica do povo brasileiro.

 

A partir do ano 2000 - principalmente por causa das comemorações dos 500 anos de descobrimento - cresceu o interesse pelo tema no Brasil. A quantidade de títulos lançados pelo mercado editorial bem como o número de trabalhos acadêmicos aumentou significativamente . No entanto, não temos conhecimento de nenhuma outra iniciativa audiovisual sobre o assunto. Ou seja, este é o primeiro documentário feito por brasileiros que mostra a origem dos cristãos novos que desembarcaram das primeiras caravelas no Brasil . Muitos deles, portugueses ligados ao comércio e às ciências que tanto contribuíram para o desenvolvimento da Península Ibérica e que trouxeram para o Brasil costumes e tradições que se incorporaram totalmente à nossa cultura mesclando-se à influência dos negros e índios.

Gostaríamos de ressaltar o caráter educacional da iniciativa. À principio serão confeccionadas 300 cópias que serão cedidas para exibição gratuita em escolas , universidades, entidades beneficentes e centros culturais.